domingo, 10 de junho de 2001

Energia nas mãos do acaso

O país está passando pela pior crise energética de toda a sua história. Já não chega o fato de a energia elétrica no Brasil ser das mais caras do mundo. O racionamento de energia elétrica está sendo imposto sobre a população e a indústria, sob ameaça de multas altíssimas e do temido apagão. Por que isso está acontecendo?
Há várias respostas. A mais imediata é que o fornecimento de energia elétrica no Brasil depende pesadamente de fontes hidrelétricas, de água que cai. Aliás, a geração de energia elétrica a partir da queda d'água é um belo exemplo da conversão de energia potencial gravitacional (todo objeto que cai de certa altura tem energia "armazenada") em energia elétrica, passando por vários estágios intermediários. Mas acho que hoje não é o dia para falar disso.
Numa frase, economia e população cresceram, aumentando a demanda de energia, e as chuvas não vieram conforme "planejado". Ponho as aspas por dois motivos. O primeiro é que parte desse planejamento se baseia em estimativas de chuvas no Sudeste: se não chove o suficiente, as represas não atingem níveis acima do considerado seguro, 49%. Aparentemente, o nível médio atual está em 27%, o que causou o desespero na administração federal, provocando as medidas já conhecidas, anunciadas dia 18 de maio pelo presidente da República.
Qual o problema com esse planejamento? Não se pode confiar na regularidade climática, baseando uma grande porção do fornecimento de energia para a região com maior demanda no país no ritmo natural das chuvas, que são mais abundantes no verão. São, mas não foram. E, muito provavelmente, segundo as simulações que estudam as consequências climáticas do efeito estufa, a concentração de gases na atmosfera irá causar oscilações climáticas ainda maiores e mais imprevisíveis.
É extremamente arriscado basearmos fatia tão grande do abastecimento de energia em uma fonte que não tem um comportamento confiável. Certamente um país com uma rede hidrográfica como a do Brasil deve explorar ao máximo o seu potencial. Mas não quase que exclusivamente.
Infelizmente, com a nova administração americana plantada nos poços de petróleo do Texas, nada será feito para minimizar a concentração de gases na atmosfera, ao menos pelos próximos quatro anos. Mesmo que medidas sejam tomadas, seus efeitos não serão imediatos. É a atitude de agir só quando não houver mais escolha. Ironicamente, o rico Estado da Califórnia também está passando por uma séria crise no fornecimento de energia, com apagões já ocorrendo e aumento de preços muito além da inflação. Sem querer parecer a trombeta do Apocalipse, esse é um indício de que está na hora de rever políticas energéticas antes que seja tarde demais.
Mais especificamente, não existe solução única e perfeita para o problema da energia. Todas as fontes possíveis têm aspectos positivos e negativos, mesmo as renováveis, como a solar ou a eólica.
O fornecimento de energia tem de ser de acordo com as características locais. Em uma área com clima desértico, com baixa concentração populacional, a energia solar é uma ótima opção. Em outra com fortes ventos, a energia eólica deve ser explorada. Às vezes, o ideal é uma combinação de diversas fontes. Em princípio, seria ideal usar o Sol como nosso provedor primário de energia -afinal, a energia criada pela fusão nuclear no interior da estrela já é transformada em biomassa pelas florestas.
Porém, a tecnologia de produção das células fotoelétricas usadas na transformação de calor em eletricidade emprega cristais cujo processo de fabricação é altamente poluente. Triste, mas verdadeiro. Para fazer um uso melhor da energia solar, é necessário aumentar tanto a eficiência do processo de transformação como criar novas tecnologias de conversão de calor em eletricidade.
É fundamental que o governo entenda a necessidade da diversificação das fontes de energia. O planeta Terra é finito, mesmo que seus vários combustíveis fósseis -carvão mineral, petróleo, gás natural- ainda venham a durar por muitas décadas. Isso requer pesquisa e investimento tanto por parte do governo como da indústria privada. Certamente, essa escolha é bem mais promissora para o futuro do país do que acreditar na dança da chuva.

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