O astrônomo e divulgador de ciência norte-americano Carl Sagan foi o primeiro a propor uma explicação para a curiosa atmosfera de Vênus, um planeta coberto por uma espessa camada de gases que deixa o calor do Sol entrar, mas pouco dele sair. Podemos fazer uma analogia com cobertores. Nosso corpo irradia calor constantemente.
A função do cobertor, ou de um casaco, é manter esse calor perto de nosso corpo, de modo a evitar que ele resfrie. Quanto maior o número de cobertores, mais quente você se sentirá, pois menos calor poderá escapar. A atmosfera de Vênus, 90 vezes mais maciça do que a da Terra, funciona como um cobertor extremamente espesso, deixando pouquíssimo do calor perto da superfície escapar.Sagan argumentou corretamente que o problema com Vênus é a sua proximidade do Sol. Se puséssemos a Terra na posição de Vênus, a temperatura aumentaria dramaticamente, levando a uma maior evaporação dos oceanos. Mais ainda, rochas que retêm dióxido de carbono (CO2), o rei dos gases que causam o efeito estufa, liberariam o gás com maior rapidez, aumentando sua concentração na atmosfera.
O novo excesso de vapor d'água e de CO2 bloquearia o fluxo de calor da Terra para o espaço, aumentando ainda mais a temperatura na superfície. Esse aumento de temperatura desencadearia um efeito estufa acelerado (como se o cobertor engrossasse com o tempo), o que rapidamente transformaria a Terra em Vênus, que tem temperaturas de 450C, dia e noite. Um verdadeiro inferno.Felizmente, a Terra não está tão perto do Sol quanto Vênus. Infelizmente, nós estamos trabalhando arduamente para engrossar o nosso próprio cobertor, com o aumento desenfreado da quantidade de emissão de CO2 e outros gases que provocam o efeito estufa em nossa atmosfera.
Um estudo do Painel Internacional de Mudança Climática (IPCC), com a participação de 700 cientistas do mundo inteiro, acaba de publicar parcialmente os resultados de seu estudo, encomendado pelas Nações Unidas e o mais detalhado até o momento.As notícias, como era de esperar, são péssimas. Na coluna de 21 de dezembro de 1997, comentei sobre os resultados do mesmo Painel, divulgados em 1995. Os resultados atuais são muito mais precisos, devido a avanços na modelagem do fluxo de calor na atmosfera e ao poder dos computadores. Por exemplo, a estação de trabalho que eu usava em 1995 era a mais rápida do mundo, com processadores de 266 MHz. Hoje, é relativamente fácil comprar um PC com processadores de frequência três vezes maior.
Em 1995, o painel do IPCC estimava que, até o ano 2001, a temperatura média global aumentaria entre 1C e 3,5C. A estimativa agora é de que o aumento possa chegar a 10,4C nos próximos cem anos, o maior aumento de temperatura nos últimos 10 mil anos, que teria consequências climáticas gravíssimas para todo o planeta.Sem querer soar como o profeta do apocalipse (que, aliás, é o assunto de meu próximo livro), mudanças de temperatura a esse nível causariam secas devastadoras, enchentes, tempestades violentíssimas e um aumento geral da pestilência, principalmente da malária e do cólera. Vários cientistas alertam para outros tipos de doenças que se manifestariam mais agressivamente, com a proliferação de insetos transmissores.
E adivinhe quem sofrerá as piores consequências? Os países da África, da Ásia e da América Latina, aí incluído o Brasil.Alguns países industrializados, incluindo o maior poluente do mundo, os EUA, ainda não ratificaram o Protocolo de Kyoto de 1997, que requer um corte na emissão dos gases que causam o efeito estufa em 5%, tendo por base os níveis de 1990, até 2012. Nem isso. O que fazer?Alguns, inclusive cientistas, só acreditam vendo e não dão credibilidade ao IPCC. Eles são aqueles que só após a casa queimar se dão conta de que não vão ter onde morar. No mínimo, podemos agir localmente, comprando carros econômicos, indo junto com colegas ao trabalho, usando transportes públicos (quando seguro), usando menos energia em casa e no escritório e criticando aqueles que não o fazem. Caso contrário, estaremos contribuindo para tornar nossa Terra um lugar insuportável para as futuras gerações.
Nenhum comentário:
Postar um comentário