domingo, 31 de dezembro de 2000

O futuro é nossa responsabilidade

Virada de ano. Chegamos ao famoso 2001. Tenho certeza de que muitos de vocês conhecem a obra-prima de Arthur C. Clarke, se não o livro, ao menos o filme lançado em 1969, igualmente brilhante, de Stanley Kubrick. O filme começa (quase) com uma espaçonave da Pan American (falida há anos), que transporta pessoas até uma base lunar. E esse é só o início: o filme conta a história de uma missão tripulada a Júpiter, em uma espaçonave controlada por um computador inteligente chamado HAL.

Um detalhe interessante: o nome HAL é obtido subtraindo uma letra das 3 que compõe a sigla IBM (I-1=H, B-1=A, M-1=L). Como profecia tecnológica, a obra não poderia estar mais errada. Não temos vôos comerciais até a Lua ou uma base lunar, muito menos vôos tripulados a Júpiter ou inteligência artificial.

Por outro lado, obras de ficção científica não têm a obrigação de ser precisas em suas projeções e fantasias futurísticas. O que é importante é que elas nos inspirem e nos façam refletir sobre o presente e o futuro. E isso "2001 - Uma Odisséia no Espaço" faz de sobra.

O filme tem um lado metafísico, representado pelo famoso monolito negro, que aparece em momentos de transição na história das idéias. Por exemplo, ele surge quando primatas bípedes descobrem que podem usar ossos como armas para matar animais e inimigos. Aparece na base lunar e novamente durante a descida até Júpiter.

O que esses monolitos são para Clarke é revelado em outros filmes e livros. Mas eu prefiro o mistério de sua presença mantido nesse filme, pois podemos equacioná-la tanto com Deus quanto com outra divindade, como uma inteligência extraterrestre que nos observa atentamente e que talvez nos inspire.

A possibilidade de vida extraterrestre, inteligente ou não, é hoje assunto de grande interesse, não só da ficção científica, mas também da pesquisa científica. Isso praticamente não era verdade em 1969. O mesmo se aplica aos computadores inteligentes: estamos ainda longe de construir uma máquina que possa "pensar", obedecendo a comandos em um programa, mas, também, criando algo de novo, inesperado (definir o que é "pensar" é assunto para outra coluna).

Mas, se ainda não temos as máquinas inteligentes, temos ao menos um aferradíssimo debate científico sobre inteligência artificial e muitos projetos que visam justamente construir tais máquinas.

Se nossos sonhos não fossem maiores do que nossa realidade, nós ainda estaríamos morando nas cavernas.

Para mim, essa é a mensagem mais importante da obra de Clarke. O futuro depende de nossa imaginação, de nossa dedicação e de nossa responsabilidade como cidadãos em um planeta finito.

Como disse o grande escritor português José Saramago, tolerância apenas não basta -precisamos respeitar também as diferenças no outro, sejam elas políticas, econômicas, culturais ou religiosas. E, acrescento, precisamos igualmente respeitar nosso frágil planeta.

Se sonhos devem ser grandes o suficiente para inspirar a realidade de amanhã, o amanhã só será possível se nós o permitirmos. Não quero deprimir ninguém na véspera do Ano Novo, mas o efeito estufa, a poluição, o buraco na camada de ozônio, o desflorestamento global, a fome, a pobreza, as doenças velhas e novas que continuam a causar sofrimento em bilhões de pessoas, tudo isso também faz parte do nosso futuro. E fingir que esses problemas não existem, ou que não irão nos afetar, sejamos ricos ou pobres, moradores da Grande São Paulo ou do sertão baiano, é absurdo. Sonhar é preciso, mas viver também é preciso.

Em cem anos nós redefinimos a vida na sociedade: rádio, TV, remédios os mais diversos, computadores, raio laser, raios X, aviões, ônibus espacial, viagem à Lua, estação espacial, Telescópio Espacial Hubble, bomba de hidrogênio, energia nuclear, carros, arranha-céus, 6 bilhões de pessoas na Terra, 170 milhões de brasileiros (você se lembra do hino da Copa de 1970? "Noventa milhões em ação, pra frente Brasil...") etc.

E o próximo século? Viagem tripulada a Marte, ao centro da Terra, inteligência artificial, seres bioeletrônicos manufaturados por meio de mistura de tecidos biológicos com componentes eletrônicos, o uso internacional da energia solar como alternativa ao petróleo e à energia nuclear, o controle completo da poluição global, o fim do efeito estufa, o fim do buraco na camada de ozônio, uma maior igualdade social, o fim (ou perto disso) da fome e da discriminação na Terra, a "internetização" completa da sociedade, o fim do analfabetismo, o fim das guerras. Acho que já está bom. Feliz futuro -aquele que nós tornarmos possível.

domingo, 24 de dezembro de 2000

A estrela de Belém

Tendo Jesus nascido em Belém da Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que vieram magos do Oriente a Jerusalém, perguntando: Onde está o rei dos judeus recém-nascido? Com efeito, vimos sua estrela no seu surgir e viemos homenageá-lo [Mateus 2, 1-2].
Assim é descrita a chegada dos reis magos a Belém no "Evangelho Segundo São Mateus". A famosa estrela ilumina os céus, celebrando o nascimento do Redentor. Que objeto celeste foi esse, que brilhou nos céus durante o dia?
Na Capela Scrovegni, em Pádua, Itália, encontra-se um dos afrescos mais belos do grande mestre toscano Giotto di Bondone, a "Adoração dos Magos", pintado no ano de 1304.
Giotto é famoso por ter sido o primeiro pintor a dar expressões humanas aos personagens da iconografia cristã. Mas hoje, para nós, a importância desse quadro é outra. Nele, Giotto representou a estrela de Belém como sendo um cometa. E não qualquer cometa, mas o cometa de Halley, que ele viu em 1301.
Essa interpretação não era novidade. Pelo menos desde 1500 a.C. os chineses já relacionavam cometas a mensagens divinas, em geral ligadas à morte de líderes políticos. Com raríssimas exceções, qualquer evento celeste inusitado, como um eclipse, um meteorito, um cometa ou uma "nova" estrela, era um mau agouro, um emissário de calamidades que estavam por vir.
Origen de Alexandria (185-253), além de ter sido um dos primeiros arquitetos da teologia cristã, foi também o primeiro cristão a argumentar que cometas, às vezes, podem trazer boa sorte.
Ele sugeriu que a estrela de Belém tivesse sido um cometa ou um meteoro: "A estrela que foi vista no leste, nós consideramos ser uma estrela nova, tal como esses objetos celestes que aparecem de vez em quando, cometas ou meteoros. Nós lemos no Tratado sobre Cometas, de Caermão, o Estóico, que, em algumas ocasiões, quando algo de bom estava por acontecer, cometas aparecem nos céus".
Origen inspirou-se em uma profecia em "Números": "Um astro procedente de Jacó se torna chefe, um cetro se levanta, procedente de Israel" [Números 24, 17". O "cetro" sobre Israel simbolizava, segundo Origen, um cometa.
São Tomás de Aquino (1225-1274) também interpretou a estrela de Belém como um sinal criado e dirigido por Deus, mas não um cometa com a missão benigna defendida por Origen.
"Cometas não aparecem durante o dia ou variam seu percurso ordinário", argumentou São Tomás. Para ele, o sinal celeste representava o inevitável fim dos tempos, anunciado através do nascimento de Jesus Cristo.
Apesar da enorme influência de São Tomás, a imagem da estrela de Belém como sendo um cometa benigno foi propagada no livro "A Lenda Dourada", de Jacó de Voragine (1230-1298), Arcebispo de Gênova. Giotto muito provavelmente conhecia a obra de Voragine, que era mais popular entre mercadores e artesãos do que a própria Bíblia.
Qual é hoje a interpretação mais provável para o evento celeste que marcou o nascimento de Jesus? Não existe um consenso. Antes de mais nada, temos de supor que o evento realmente ocorreu e que não foi apenas um símbolo alegórico de um acontecimento fundamental para a religião dos cristãos. Afinal, o próprio Origen de Alexandria insistiu que, das três interpretações possíveis para a Bíblia -a literal, a moral e a alegórica-, a última era a mais adequada.
É pouco provável que a interpretação da estrela de Belém como um cometa esteja correta. Cometas têm uma luminosidade baixa e difusa e, devido à cauda, não se parecem muito com estrelas.
É mais provável que a estrela de Belém tenha sido uma supernova ou uma nova, ambas fenômenos decorrentes de grandes explosões estelares.
Uma supernova ocorre quando estrelas com massas superiores a oito vezes a massa do Sol esgotam seu combustível e implodem devido à sua própria gravidade. Essa implosão reverte sua direção quando a matéria das camadas superiores da estrela choca-se com o núcleo denso, liberando quantidades enormes de energia. Tão grandes que podem fazer uma supernova brilhar por meses a fio, mesmo durante o dia.
Mas a possibilidade maior é que a Estrela de Belém tenha sido mesmo uma nova próxima, que brilha apenas por dias ou semanas. Uma nova ocorre quando duas estrelas orbitam muito perto uma da outra. Uma das estrelas, uma anã branca -o resto mortal e compacto de uma estrela como o Sol- "suga" a matéria da outra estrela até acumular uma quantidade de hidrogênio em sua superfície que, devido à altíssima temperatura, detona como uma bomba termonuclear gigantesca. Essa sim é uma celebração à altura da inauguração da Era Cristã. Feliz Natal a todos.

domingo, 17 de dezembro de 2000

Uma origem violenta da vida na Terra?

Uma das questões mais intrigantes para os cientistas de hoje é a questão da origem da vida. O problema começa justamente com a definição, ou com a falta dela, do que seja vida. Por incrível que pareça, não existe ainda um consenso de como definir vida.

De qualquer forma, sabemos que organismos vivos têm as seguintes características: 1) eles reagem ao meio em que vivem e, em geral, têm a capacidade de se curar quando feridos; 2) eles podem crescer, ingerindo alimentos e transformando-os em energia; 3) eles se reproduzem, passando algumas de suas características para sua prole; 4) eles podem sofrer modificações genéticas e, portanto, evoluir de modo a adaptar-se (ou não) a mudanças no meio ambiente.

Mas essas quatro regras estão longe de ser absolutamente válidas, existindo muito espaço para interpretações paralelas. Eis alguns exemplos que ilustram a complexidade do fenômeno vida:
Estrelas respondem à atração gravitacional de seus vizinhos, podem crescer por acréscimo de material à sua volta, geram energia e se "reproduzem" ao propiciar o nascimento de outras estrelas durante seus momentos finais, e estas contêm algumas de suas características.

Ao esgotar seu combustível nuclear, estrelas passam à sua fase final de forma explosiva; essas explosões podem gerar instabilidades gravitacionais em nuvens de gás que estejam por perto. Por sua vez, essas nuvens instáveis contraem-se devido à sua própria gravidade, gerando novas estrelas. Mas acho que todos vocês concordam que estrelas não são vivas. Um vírus é cristalino e inerte quando isolado. Mas, quando alojado em uma célula, ele exibe todas as propriedades de um ser vivo, usando o material genético da célula para crescer e se reproduzir.

Muitos cientistas acreditam que o vírus é justamente a ponte entre o vivo e o inanimado, um organismo tão simples que não consegue manter-se vivo por si só, mas complexo o suficiente para viver por meio de outros seres vivos. Hoje, o consenso parece ser que a distinção entre o vivo e o inanimado não deva seguir uma lista rígida de parâmetros, mas adaptar-se à complexidade de cada situação.

Visto que temos problemas definindo o que é vida, não é nenhuma surpresa aceitar que também não entendemos sua origem. Aqui na Terra, formada há 4,6 bilhões de anos, os primeiros sinais de organismos vivos datam de 3,85 bilhões de anos atrás. Tais organismos, simples unicelulares, reinaram por pelo menos 1 bilhão de anos, até organismos mais complexos, mas ainda unicelulares, como as amebas, aparecerem.

Recentemente, a história da vida na Terra teve uma grande surpresa: pesquisadores descobriram que a vida saiu da água muito antes do que se imaginava. Não há 1,2 bilhão de anos, mas há 2,6 bilhões, uma diferença enorme. Quanto mais tempo de vida, mais fácil é gerar estruturas complexas. Talvez a imagem que aprendemos na escola do peixe que cria patas em lugar de barbatanas e sai da água não seja tão precisa assim. Aparentemente, essas formas terrestres de vida eram muito primitivas, semelhantes às encontradas então nos oceanos.

Essas datas são interessantes porque justamente há 3,9 bilhões de anos a Terra e a Lua foram submetidas a um intenso bombardeio de asteróides e cometas, detritos gerados durante a formação do Sistema Solar. Esse bombardeio foi confirmado pela análise de rochas lunares, que mostram uma abundância de materiais vitrificados durante essa época. Esses materiais são típicos das enormes temperaturas que ocorrem devido a impactos com objetos celestes.
A colisão de um meteoro ou cometa literalmente derrete superfícies rochosas que, ao se solidificarem novamente, assumem um aspecto amorfo, ou vitrificado. Na Terra, devido a erosão e a efeitos geológicos, é praticamente impossível encontrar rochas tão antigas ainda preservadas. Mas o que aconteceu com a Lua certamente aconteceu com a Terra.

Esse bombardeio pode ter criado as condições necessárias para tornar a vida na Terra possível, como calor e vários compostos orgânicos que existem em asteróides e cometas. Ou, quem sabe, a vida possa ter vindo de carona em alguns desses bólidos celestes. Qualquer que seja a resposta correta (eu prefiro a primeira opção), parece claro que, sem os bombardeios celestes, a vida não teria surgido aqui. As colisões podem destruir, mas também podem criar.

domingo, 10 de dezembro de 2000

Elogio da razão pura

A ciência, como a religião, tem seus profetas, aqueles que enxergam mais longe do que outros, muito antes do que todos. Claro, as "revelações" vislumbradas pelos profetas da ciência não têm nada de sobrenatural, visto que elas se baseiam em uma combinação de lógica e de intuição, muitas vezes alimentadas por observações ou resultados experimentais.

Mas, em casos raros, esses profetas descrevem o que posteriormente se constatará ser verdade de forma tão inesperada que só posso chamá-los de visionários da ciência, os que enxergam sem precisar olhar. O filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) é um desses raros visionários da ciência.Kant é bem mais conhecido por sua filosofia do que por sua ciência, mesmo tendo sido igualmente fascinado por ambas.

Durante a juventude, eram o cosmos e a ciência newtoniana, com sua simplicidade e abrangência, que alimentavam sua imaginação. Para ele, como para muitos outros racionalistas do século 18, Deus era visto como o criador do Universo e de suas leis naturais, enquanto o homem era seu decodificador.Em 1755, com apenas 31 anos, Kant escreveu o tratado "História Universal Natural e Teoria dos Céus", dedicado a Frederico, o Grande, rei da Prússia. Kant esperava impressionar o rei o bastante para ganhar uma posição acadêmica em alguma universidade.

Infelizmente, seu editor foi à falência pouco antes de publicar o tratado, e Frederico jamais recebeu sua cópia. Nesse tratado encontramos verdadeiras jóias do pensamento kantiano e de sua belíssima visão cósmica.

A visão kantiana do Universo baseava-se numa hierarquia de estruturas que se repetia dos planetas às galáxias. Manifestação material do infinito poder criativo de Deus, o Universo replicava-se em todas as dimensões, das menores escalas às maiores.

Foi Kant quem sugeriu, antes de qualquer outro, que o Universo é composto por inúmeras galáxias como a Via Láctea, todas elas repletas de estrelas que, como o Sol, seriam rodeadas de planetas. Esses, por sua vez, rodeados por satélites. As mesmas estruturas, grosso modo, repetindo-se pelo Universo afora.

Kant imaginou um processo de formação para o Sistema Solar que, em muitos aspectos, sobrevive até hoje. Para ele, o sistema nasceu de uma nuvem de gás que se contraiu sob a própria gravidade.

No início era o caos, com átomos dispersos pelo cosmos. Instabilidades nessa matéria primordial atraíram mais matéria, criando uma combinação de movimentos de contração gravitacional e rotação. Na medida em que a recém-formada nebulosa encolhia e rodava, ela também se achatava nos pólos.Instabilidades locais, semelhantes às que geraram a grande nebulosa, criaram os planetas e seus satélites. Kant sabia que as órbitas planetárias se encontram todas praticamente num mesmo plano que atravessa o Sol, como um disco atravessando uma bola de tênis (não em escala).

Seu modelo reproduzia essas observações, ao menos qualitativamente. Aliás, essa é uma das críticas ao Kant cientista: que ele argumentou o Universo, ao invés de calculá-lo, como fez Laplace. Sua intuição era absolutamente cristalina, movida por uma visão teopoética do cosmos -razão inspirada pela emoção.

A visão de Kant foi além da formação do Sistema Solar e da repetição das hierarquias cósmicas. Também especulou, corretamente, que ciclos de criação e destruição pontuam a história do Universo.

Imaginou que a mesma matéria que cria planetas e cometas vai também destruí-los, já que "nos confins do tempo" tais objetos cairão no centro de suas órbitas. Kant imaginou que isso eventualmente criará uma "conflagração", explosão que reespalhará a matéria pelo cosmos, recriando o caos primordial.

Mais uma vez, pequenas instabilidades nessa matéria irão crescer, criando novos sóis e planetas, reiniciando a dança cósmica que Kant chamou de "Fênix da Natureza". Portanto, para Kant, o Universo repetia os ciclos de vida e morte das pessoas e de tudo na Natureza, com exceção da alma, fez questão de dizer, que é eterna. Sua obra, sem dúvida, é.

domingo, 3 de dezembro de 2000

Uma luz muito coerente

O laser é, tanto quanto o computador, parte imprescindível de nosso dia-a-dia: impressoras a laser, discos laser, DVDs, cirurgias e outros procedimentos médicos. Sem dúvida, o laser, que virou quarentão este ano, merece o nosso respeito como uma das invenções mais críticas do século 20. Daí que hoje gostaria de celebrá-lo, dedicando esta crônica a esse importante aliado de nosso laser.

Desculpem-me, caros leitores, mas não resisti a trocar o "z" pelo "s".Tudo começou em 1905, quando Einstein postulou que a luz pode ser interpretada tanto como uma onda, algo que já se sabia, quanto como uma partícula, o fóton, algo que tomou muita coragem na época. A luz visível é apenas uma das várias manifestações da radiação eletromagnética, que inclui as ondas de rádio, as radiações infravermelha e ultravioleta, os raios X e os raios gama.

A única diferença entre esses tipos de radiação é a frequência, que cresce das ondas de rádio até os raios gama. Einstein argumentou que a radiação eletromagnética pode ser representada por essas pequenas "balas" de radiação, cuja energia cresce com a frequência. Os fótons das ondas de rádio, de menor frequência, têm as menores energias, enquanto que aqueles dos raios gama são os mais energéticos.

O segundo componente que precisamos para entender como funcionam os lasers é o simples modelo atômico proposto por Niels Bohr em 1913. Segundo Bohr, o átomo pode ser representado por um pequeno núcleo de carga positiva e por elétrons que giram em torno desse núcleo em órbitas discretas. A novidade aqui é a idéia de órbitas discretas: é como se os elétrons só pudessem andar em trilhos concêntricos circundando o núcleo, não podendo andar no espaço entre os trilhos.

O trilho mais próximo do núcleo é o "estado fundamental" do átomo; os elétrons não podem cair no núcleo. Para subir de uma órbita para outra, os elétrons precisam de energia, tal como nós precisamos de energia para subir uma escada. Essa energia é fornecida por fótons, que precisam ter energias exatamente iguais à diferença de energia entre as duas órbitas. O elétron "come" (absorve) o fóton e com isso tem energia suficiente para subir de nível. Já um elétron em um nível superior (ou excitado) só pode descer emitindo um fóton com energia idêntica à diferença de energia entre as duas órbitas.

Portanto átomos em estados excitados emitem fótons ou radiação com frequência determinada.Imagine um átomo no estado fundamental. Se o bombardearmos com fótons de energia adequada, os elétrons irão absorvê-los e migrar para estados excitados. Esse processo é conhecido como "absorção estimulada". Caso o átomo esteja em um estado excitado, duas coisas podem acontecer: ou ele decai espontaneamente, emitindo um fóton com a frequência adequada (emissão espontânea), ou estimulamos seu decaimento bombardeando-o com fótons de frequência adequada (emissão estimulada). Esse último processo é fundamental no funcionamento do laser.

Isso porque, quando um fóton estimula o decaimento do átomo, outro fóton será liberado durante o decaimento, com energia idêntica à do primeiro. Ou seja, usamos um e pegamos dois. Uma situação semelhante acontece quando tentamos recuperar uma bola que ficou presa em uma árvore atirando outra bola. Se formos bem sucedidos, recuperamos a bola que jogamos e a que estava presa. Portanto, se prepararmos um número grande de átomos em um estado excitado e bombardearmos um desses átomos com um fóton, obtemos dois fótons (o usado como "bala" e o liberado no decaimento).

Esses dois fótons se chocam com dois outros átomos, liberando dois outros fótons (quatro no total), esses quatro liberam oito, e assim por diante, em uma incrível amplificação do efeito inicial. Daí a sigla "laser", que vem do inglês "Amplificação de Luz por Emissão Estimulada de Radiação". Mais ainda, todos esses fótons têm exatamente a mesma energia, formando radiação altamente coerente. Por isso o laser tem um tom tão intenso.Os lasers mais comuns usam uma combinação de gases hélio e neônio. Essa mistura é estimulada por uma descarga elétrica que põe átomos de neônio em um estado excitado. Quando um fóton estimula seu decaimento, outros fótons são emitidos, gerando uma luz vermelha muito familiar. Na próxima vez que você ouvir um CD, essa familiar e intensa luz vermelha será menos misteriosa