domingo, 28 de março de 2010

Sobre a crença e a ciência




Respeito os que creem. A ciência não tem agenda contra a religião



A pergunta que mais me fazem quando dou palestras, ou mesmo quando me mandam e-mails, é se acredito em Deus. Quando respondo que não acredito, vejo um ar de confusão, às vezes até de medo, no rosto da pessoa: "Mas como o senhor consegue dormir à noite?".

Não há nada de estranho em perguntar a um cientista sobre suas crenças. Afinal, ao seguirmos a velha rixa entre a ciência e a religião, vemos que, à medida em que a ciência foi progredindo, foi também ameaçando a presença de Deus no mundo. Mesmo o grande Newton via um papel essencial para Deus na natureza: Ele interferia para manter o cosmo em xeque, de modo que os planetas não desenvolvessem instabilidades e acabassem todos amontoados no centro, junto ao Sol. Porém, logo ficou claro que esse Deus era desnecessário, que a natureza podia cuidar de si mesma. O Deus que interferia no mundo transformou-se no Deus criador: após criar o mundo, deixou-o à mercê de suas leis.

Mas, nesse caso, o que seria de Deus? Se essa tendência continuasse, a ciência tornaria Deus desnecessário?

Foi dessa tensão que surgiu a crença de que a agenda da ciência é roubar Deus das pessoas. Um número espantoso de pessoas acha mesmo que esse é o objetivo dos cientistas, acabar com a crença de todo mundo. Os livros de Richard Dawkins e outros cientistas ateus militantes, que acusam os que creem de viverem num estado de delírio permanente, não ajudam em nada a situação. Mas será isso mesmo o que a ciência pretende? Será que esses fundamentalistas ateus falam por todos os cientistas?

De modo algum. Eu conheço muitos cientistas religiosos, que não veem qualquer conflito entre a sua ciência e a sua crença. Para eles, quanto mais entendem o Universo, mais admiram a obra do seu Deus. (São vários.) Mesmo que essa não seja a minha posição, respeito os que creem. A ciência não tem uma agenda contra a religião. Ela se propõe simplesmente a interpretar a natureza, expandindo nosso conhecimento do mundo natural. Sua missão é aliviar o sofrimento humano, aumentando o conforto das pessoas, desenvolvendo técnicas de produção avançadas, ajudando no combate às doenças. O "resto", a bagagem humana que acompanha e inspira o conhecimento (e que às vezes o atravanca), não vem da ciência como corpo de saber, mas dos homens e das mulheres que se dedicam ao seu estudo.

É óbvio que, como já afirmava Einstein, crer num Deus que interfere nos afazeres humanos é incompatível com a visão da ciência de que a natureza procede de acordo com leis que, bem ou mal, podemos compreender. O problema se torna sério quando a religião se propõe a explicar fenômenos naturais; dizer que o mundo tem menos de 7.000 anos ou que somos descendentes diretos de Adão e Eva, que, por sua vez, foram criados por Deus, é equivalente a viver no século 16 ou antes disso. A insistência em negar os avanços e as descobertas da ciência é, francamente, inaceitável. Por exemplo, um número enorme de pessoas se recusa a aceitar que o homem pousou na Lua. Quando ouço isso, fico horrorizado. Esse feito, como tantos outros, deveria ser celebrado como um dos marcos da civilização, motivo de orgulho para todos nós.

Podemos dizer que existem dois tipos de pessoa: os naturalistas e os sobrenaturalistas. Os sobrenaturalistas veem forças ocultas por trás dos afazeres dos homens, vivendo escravizados por medos apocalípticos e crenças inexplicáveis. Os naturalistas aceitam que nunca teremos todas as respostas.

Mas, em vez de temer o desconhecido, abraçam essa ignorância como um desafio e não uma prisão. É por isso que eu durmo bem à noite.

terça-feira, 23 de março de 2010

Gleiser critica rumos da física


Cientista brasileiro chama de metafísica a busca de uma teoria única para as forças da natureza


Marcelo Gleiser




por José Paulo Lanyi.
Fotos de Paulo Vellozo





Todas as evidências experimentais mostram que é uma obstinação equivocada o caminho trilhado por grande parte dos físicos teóricos para unificar em uma ‘teoria total’ as quatro forças conhecidas até hoje pela ciência (eletromagnética, gravitacional, nuclear forte e nuclear fraca). Essa foi a posição apresentada pelo físico Marcelo Gleiser, na sexta-feira (19/03), a uma plateia de professores e estudantes do Instituto de Física Teórica (IFT), além de pesquisadores de outras instituições e interessados em geral.

Para Gleiser, o sonho de obter uma única equação para descrever essas quatro forças esbarra em um problema sem solução: é impossível obter todas as informações empíricas para justificar uma teoria unificada da natureza. "Chega uma hora em que a gente tem que entregar os pontos", afirmou o físico .

Na palestra, realizada no auditório do Instituto de Artes (IA), que integra com o IFT o câmpus da Barra Funda, Gleiser recorreu à história da ciência para justificar a sua visão sobre esse tema, que permeia o seu livro Criação Imperfeita - Cosmo, Vida e o Código Oculto da Natureza (Editora Record, 2010, 366 págs.).

Professor de Física e Astronomia do Dartmouth College em Hanover (EUA), onde dirige um grupo de pesquisa em física teórica, Gleiser também é conhecido por seu trabalho como divulgador científico, em livros, artigos, programas de televisão, documentários e consultoria para o cinema.

A convite do diretor do IFT, Rogerio Rosenfeld, ele apresentou e debateu com o público o conteúdo do seu novo livro. Os dois pesquisadores são amigos desde 1985, época em que Rosenfeld fazia o seu doutorado na Universidade de Chicago (Illinois, EUA) e o segundo pesquisava para o seu pós-doutorado no Fermilab (Laboratório Nacional Fermi), próximo a Chicago.

Na entrevista a seguir, Gleiser conversa sobre os fatores metodológicos que o levaram a mudar de ideia em seu entendimento científico sobre uma "teoria total". Ele também faz críticas ao que classifica de dogma, na busca de setores da ciência pela predominância de uma teoria. "É uma coisa meio protegida, e se você não trabalha nisso [as supercordas], você não ganha bolsa."

Portal Unesp - Até que ponto o senhor consegue ter segurança para optar por um novo caminho na ciência?
Marcelo Gleiser - Não existem seguranças, existem percepções. Uma das coisas que eu falo é que a ciência não consegue chegar a uma verdade absoluta. Ela consegue chegar a narrativas cada vez mais completas da realidade. O que eu estou fazendo é uma análise essencialmente crítica, não da conclusão, mas da percepção, que é aberta na ciência, de que existe essa estrutura fundamental unificada por trás das coisas. A gente não tem nenhuma prova empírica de que isso seja verdade. E a física é uma ciência empírica. Então, depois de trinta, quarenta anos de essa percepção não ter sido provada, está na hora de mudar um pouco essa rota e começar a repensar qual é realmente a lição que a natureza está nos dando.

Portal Unesp - Nós estamos falando do contexto de descoberta. Nessa fase, hipóteses, teorias ou especulações também não seriam valiosas, mesmo que ainda não se tenha um resultado empírico?
Gleiser- Sem dúvida. Eu me lembro de que o meu pai me dizia: ‘Meu filho, um resultado negativo também é um resultado positivo’. Quer dizer, uma maneira de você testar uma teoria é provar que ela está errada, não só provar que ela está certa. O problema é que essas ideias em ciência não conseguem nem ser testadas. Estão além do método empírico, que é por definição como a ciência funciona. É um problema de metodologia absoluto, em que você não consegue nem provar que a sua teoria está certa ou que está errada. Então você passa a outra esfera, que para mim não pertence à física.

Portal Unesp - Na sua exposição, o senhor disse que, em relação a um modelo de ‘teoria total', não se tem conseguido fazer predições. O senhor parte do princípio de que não se consegue fazê-las porque ainda não se conseguiu testar essa teoria?
Gleiser - Não. Quando você desenvolve uma teoria, as teorias sempre fazem previsões. Por exemplo: se a minha teoria estiver certa, esse [um determinado] fenômeno vai ocorrer. Então você vai lá e busca por esse fenômeno com os seus instrumentos. O que está acontecendo é que algumas das teorias de unificação são tão abstratas, tão metafísicas que elas não conseguem nem fazer uma previsão que possa ser testada. Então a coisa fica muito difícil.


Patrulhamento

Portal Unesp - O senhor fala de dogma ao se referir à atitude de defensores da teoria das supercordas, o que parece ser uma reação sua a uma espécie de 'patrulhamento' no mundo da física em relação a quem pensa diferente. É isso que o senhor está dizendo?
Gleiser - É isso. Existe toda uma ‘sociologia’ em relação a isso. Teve um livro de um autor chamado Lee Smolin, que em português seria "O Problema com a Física" [The Trouble with Physics: The Rise of String Theory, The Fall of a Science, and What Comes Next]. Ele fala, vamos dizer, dessa ‘sociologia’. Se você não faz parte do clube, você está fora, ninguém aceita as suas ideias. É uma coisa meio protegida, e, se você não trabalha nisso, você não ganha bolsa, porque os comitês que decidem as bolsas têm um pessoal que trabalha só nisso. Muitos dos empregos acadêmicos nos anos 80 e 90 eram para quem trabalhava em supercordas. Ponto. Se você não mexesse com isso, era muito difícil você conseguir emprego. Você pode fazer uma analogia. Nessas teorias, você tem o papa, ou alguns papas, você tem um bando de cardeais e uma porção de padres. Então existe uma hierarquia ideológica que esses papas aí, como o Eddie Whitten e alguns outros, lançam as ideias fundamentais da teoria e todo mundo vai atrás.

Portal Unesp - Apesar de saber que os cientistas em geral não têm interesse em filosofia da ciência, cabe aqui uma pergunta: o senhor chegou a essa nova visão metodológica a partir da sua própria verificação das teorias e experiências ou também se baseou em fontes como Karl Popper [1902-1994], Thomas Kuhn [1922-1996] e Imre Lakatos [1922- 1974]?
Gleiser - Eu acho que é uma combinação das duas. Eu, modéstia à parte, sou um dos raros físicos que gostam, estudam e entendem um pouquinho de filosofia e de história da ciência. Não tem muitos, porque a maioria fica realmente muito focada na pesquisa, naquela área ali. Muito por esse meu trabalho de divulgação de ciência, mas mesmo antes disso, eu sempre me interessei pela parte da história da ciência. Li o Lakatos, li o Thomas Kuhn, li o Popper. Eu tenho uma formação talvez um pouco mais crítica nesse sentido, mais humanista da ciência. Então eu acho que essa minha mudança de posição não foi uma coisa abrupta, foi uma coisa gradual, uma maturação profissional que ocorreu com o casamento dessas duas coisas, o lado empírico e o lado mais filosófico.


Teorias não-testáveis

Portal Unesp - Em linguagem popperiana, pode-se dizer que uma das suas constatações é de que esse esforço em busca da simetria está levando a teorias que não são falseáveis?
Gleiser - Exatamente. Segundo Popper, você tem que provar que uma teoria está errada. E essas teorias [da 'totalidade'] você não consegue provar nunca que elas estão erradas, porque você pode sempre ajustar os parâmetros e falar: 'Ahá! Essa teoria você tem que testar em uma energia maior'.

Portal Unesp - O enunciado dessas teorias não seria falseável em vista do nível de abstração?
Gleiser - Algumas. Tem de tudo. Algumas são tão loucas que realmente estão fora do método.

Portal Unesp - Nessa teoria das supercordas, há alguma que seja testável?
Gleiser - Não. No momento, diretamente não. Só indiretamente. Se descobrirem partículas com certas propriedades, elas indicarão que talvez possa existir o que está na teoria das supercordas. Mas mesmo assim é uma evidência indireta.

Portal Unesp - Pela teoria de Thomas Kuhn, ciência é o que uma comunidade de especialistas diz o que a ciência é. Em relação a esse ‘grupo das supercordas’, a impressão, a partir do que o senhor está propondo, é de que seja uma comunidade que dita o que deve ser estudado pela ciência. Embora o senhor diga que, por carecer de uma base empírica, não seja ciência. [A visão desse grupo] é de uma espécie de ‘Thomas Kuhn ao contrário’. Seria isso?
Gleiser - É interessante essa idéia, é por aí... Mas, quer dizer, eles não acham que não é ciência. Eles acham que é ciência absoluta.

Portal Unesp - Em Thomas Kuhn, isso remete à teoria da incomensurabilidade ou incomunicabilidade entre os adeptos de diferentes paradigmas científicos. Mas, de qualquer forma, espera-se que o cientista faça uma verificação empírica, que faça medições.
Gleiser - A mensuração deles é a seguinte. Em um certo limite, as teorias de supercordas reproduzem a gravidade. Então, para eles isso já é o máximo. ‘Se a minha teoria reproduz a gravidade, ela prevê que a gravidade tem que existir’. Para eles, isso já é um sucesso da teoria. Mas você pode construir uma teoria completamente errada e que seja compatível com um fato concreto. A compatibilidade de uma teoria com um fato não significa que ela esteja certa.

Portal Unesp - Esses vinte ou trinta anos de insucessos da ciência na busca por justificar as 'teorias de unificação', conforme o seu ponto de vista, são mesmo suficientes para levarem o senhor a mudar de ideia em relação à possibilidade de sucesso dessas hipóteses?
Gleiser - Existe um obstáculo fundamental. A gente só conhece o mundo através dos nossos instrumentos. Tudo o que a gente conhece da realidade física é porque a gente mede: bactérias com os nossos microscópios, as galáxias distantes com os nossos telescópios... Esses instrumentos, mesmo que eles sejam muito poderosos, têm um limite na precisão. Você não pode ir além disso. Então existe toda uma fachada da realidade que é absolutamente invisível para nós. É impossível, a priori, construir uma teoria total da natureza porque você nunca vai ter a totalidade de informação da natureza para poder demonstrar se essa teoria está certa ou se está errada. Você jamais pode empiricamente demonstrar que essa é uma teoria final, porque, mais tarde, daqui a cinquenta anos, quando os seus instrumentos estiverem mais poderosos, você puder ver uma coisa de uma forma mais profunda, pode descobrir que tem um outro aspecto que você nem podia imaginar que existia. Então, a priori, essa ideia de totalidade do conhecimento é errada.

Imperfeição da natureza é tema de novo livro de Marcelo Gleiser


23/03 - 12:27 - Priscila Borges, iG Brasília

O físico Marcelo Gleiser, 51 anos, se acostumou a decifrar a ciência para o público leigo. Programas de TV, coluna em jornal, palestras -- os meios utilizados pelo experiente cientista e professor são inúmeros. O esforço de Gleiser, que decidiu ser físico ouvindo do pai que ninguém “o pagaria para contar estrelas”, tem uma razão nobre: dar às pessoas a chance de construir uma visão mais crítica do mundo. Para ele, a compreensão da ciência liberta o ser humano do medo do desconhecido. 
 
“Não é só a tecnologia que faz do mundo de hoje diferente do mundo de Cabral, em 1.500. O modo como ele pensava que o mundo era é totalmente diferente. A ciência faz parte da nossa cultura. As pessoas precisam absorver isso até como ferramenta para desenvolver um pensamento mais crítico”, afirma o professor de física teórica na Dartmouth College, nos Estados Unidos. Agora, Gleiser pretende ir além e quebrar paradigmas da ciência, mostrando que a natureza não é perfeita.

O assunto do novo livro de Marcelo Gleiser, Criação imperfeita — Cosmo, vida e o código oculto da natureza, publicado pela Editora Record, foi o mote usado pelo autor para mostrar aos estudantes da Universidade de Brasília (UnB) que não há limites para o conhecimento. Nesta terça-feira, ele falou a calouros e veteranos em um evento organizado pela reitoria para receber os alunos: a Aula da Inquietação. O objetivo do encontro é levar os jovens a refletir sobre o papel deles na universidade.

“Queria mostrar a eles que o conhecimento não é uma coisa finalizada. É um processo e cada um de nós contribui para ele”, comenta o físico. “As visões de mundo que a gente constrói estão sempre em fluxo e a coisa mais importante que se pode aprender na escola ou fora dela é pensar criticamente sobre o que você aprende e sobre o mundo”, sentencia.

A voz da experiência
Gleiser fala de si próprio quando toca nesse assunto. O novo livro é fruto das mudanças de pensamento que ele viveu ao longo de anos de estudo e pesquisa. Ele conta que, quando começou a carreira, acreditava que havia uma ordem unificadora de tudo o que existe no universo – como boa parte do mundo ocidental. Buscava por uma teoria final, que explicasse o sentido e o funcionamento do cosmo. “Hoje mudei completamente minha percepção da realidade”, diz, categórico.
Marcelo Gleiser: natureza cria através de imperfeições e assimetrias
Para o cientista, a perfeição e a simetria da natureza são fantasias. “Não há nada de concreto que aponte nesse caminho. As pistas vão na direção oposta”, avisa. Gleiser conta que as experiências que desenvolveu mostraram que a natureza cria por meio de suas assimetrias e imperfeições. No novo livro, há um capítulo dedicado exclusivamente a Johannes Kepler, físico que buscava a perfeição da forma dos movimentos celestes. O capítulo, chamado de O erro de Kepler, critica a insistência da perfeição.

“Chega um ponto em que a gente tem de deixar de insistir nessa busca pela ordem, que é mais uma produção de um desejo nosso, e olhar para o que a Terra quer nos dizer”, enfatiza o físico. Ele classifica a própria obra como um manifesto. Um manifesto sobre a importância da vida e do homem para o universo. “Os seres humanos, cada vez mais desacreditados, têm uma vida complexa e inteligente muito rara. Somos como o que o universo pensa sobre si mesmo. Essa consciência cósmica é essencial para preservar o que a gente tem”, diz.
Compreender a complexidade da vida e da natureza, na opinião de Gleiser, é criar uma relação espiritual com o universo. “É uma direção de nova espiritualidade, que nada tem a ver com religião organizada”, afirma.

Entrevista Correio Brasiliense

Marcelo Gleiser diz por que deixou de buscar uma explicação única para o Universo e passou a se interessar pelo estudo da assimetria

Publicação: 22/03/2010 07:00


Durante entrevista à uma rádio brasiliense, o físico Marcelo Gleiser explicava, em plena Rodoviária do Plano Piloto, as teorias mais modernas sobre a astrofísica e a origem do Universo. Enquanto o pesquisador dava detalhes sobre a teoria do big bang, que afirma que tudo surgiu de uma imensa explosão há cerca de 14 bilhões de anos, um rapaz que passava pelo local perguntou: “Então, o senhor quer tirar até Deus de nós?”.

A provocação quase involuntária do homem foi capaz de influenciar o pensamento de um dos maiores cientistas brasileiros da atualidade. Dilemas como as relações entre ciência, religião e espiritualidade e os limites do conhecimento humano são apresentados em seu novo livro, Criação imperfeita — Cosmo, vida e o código oculto da natureza (Record), lançado recentemente.

Carioca, 51 anos, formado em física pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Gleiser tem mestrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e doutorado pelo King's College London, do Reino Unido. Ele, que desde 1991 é professor de física teórica na universidade americana Dartmouth College, em Hanover, conversou com o Correio sobre essa e outras questões que inquietam leigos e cientistas de todo mundo.

Lidar com o mistério é com ele mesmo. Amanhã, o físico ministrará a Aula da Inquietação da Universidade de Brasília (UnB), evento em que cientistas de renome internacional abordam questões filosóficas do mundo contemporâneo e estimulam os universitários a refletir sobre seu papel no desenvolvimento da ciência.

O senhor leva conhecimento de ponta na área da astrofísica para o leitor comum, que não tem grande bagagem científica. Como surgiu esse trabalho?
Em 2007, eu lancei meu primeiro livro, chamado A dança do Universo, onde eu contava um pouco da história da cosmologia, de como o homem vem explicando a história do Universo, desde os mitos de criação até a ciência moderna. Eu fiquei surpreso com a receptividade das pessoas a esse tipo de ideia. O livro foi muito bem, ganhou o Prêmio Jabuti. Foi aí que percebi que existia um apetite muito grande das pessoas com relação a esse tipo de questionamento. Desde então, continuo fazendo isso, trazendo a ciência para as pessoas comuns.

Quando o senhor decidiu que seria cientista? Acontecimentos da sua infância, como a morte prematura de sua mãe, e da sua adolescência conturbada influenciaram de alguma forma na escolha?
Sem dúvida foram muito importantes. Nós somos produto de nossa história. Não há como evitar sermos uma combinação de nossos genes com a nossa história. Eu compartilho a minha história pessoal para mostrar ao leitor que eu também sou produto de um passado, que minhas escolhas profissionais e minha carreira também são fruto das experiências vividas por mim. Tento fazer o leitor embarcar em uma viagem intelectual, mas com um amigo, alguém que ele conheça. Humanizar a ciência.

A ciência pode explicar tudo? O senhor ainda acredita que um dia o ser humano terá a resposta para todos os seus questionamentos?
Não, eu acredito que a ciência não pode explicar tudo. O que não quer dizer que eu acredite que existam fenômenos sobrenaturais ou coisas desse tipo. O que todas as pessoas precisam saber é que a ciência é uma construção humana, é uma criação nossa, por isso ela explica o mundo da melhor maneira que a gente pode. Isso significa que, como somos criaturas limitadas, as nossas explicações do mundo também são limitadas. A ciência é uma narrativa, algo que criamos para entender o mundo em que vivemos. Ela reflete a humanidade nas suas maiores criatividades e também nas suas maiores limitações.

O senhor passou grande parte de sua carreira trabalhando em uma expressão matemática unificadora, que conseguisse explicar tudo que existe no Universo. Hoje, afirma que essa unificação não existe. Como ocorreu essa mudança tão drástica de visão?
A gente só pode tomar uma decisão dessas quando realmente faz parte do processo. O fato de eu ter trabalhado anos nessa área me equipou com muita habilidade técnica, com muita matemática, com muita bagagem conceitual, mas também com muita capacidade crítica para ver até que ponto aquele caminho que eu seguia estava certo ou não. Então, depois de anos de reflexão e pesquisa nessa área, eu comecei a ver que essa busca por uma teoria final era mais uma crença do que uma realidade científica.

Então, o senhor acredita que nunca poderemos chegar a uma explicação única para todo o Universo?
É muito importante as pessoas entenderem que a ciência se baseia nas medidas que a gente faz. Você pode ter a ideia mais genial do mundo. Se ela não for confirmada por experimentos, não é ciência. O que está acontecendo é que essa noção de teorias finais, de explicações únicas, são teorias que já estão no mercado há 30 anos e estão muito longe de serem testadas. Acho que temos de começar a pensar: “Será que esse é o caminho certo ou será que a natureza está contando uma outra história pra gente e estamos nos recusando a ouvi-la?” Há uns oito anos, eu dei uma acordada e concluí que esse caminho que estamos seguindo com tanta avidez talvez seja o caminho errado. A ideia é tentar olhar para um outro caminho, e ver que ele faz sentido.

Qual seria a alternativa para esse modelo de pensamento que busca uma teoria final?
Essa ideia de uma teoria final, que seja uma explicação universal, é uma noção que depende muito da ideia de perfeição e simetria. De que, por trás das imperfeições e das variações do mundo, existe uma regularidade, um padrão. Só que, quando vamos olhando para o mundo, fazendo experimentos, a gente descobre que não é bem assim. Por que existe matéria? Por que existem galáxias? Porque existe a vida? Por que existe a vida complexa? Todos esses processos, que chamamos de formação de estruturas materiais — como nós mesmos, que somos a estrutura material mais fascinante que existe, já que somos um bando de moléculas com capacidade de pensar —, dependem de imperfeições, de assimetrias. A natureza cria por meio de suas imperfeições. Eu acho que esta é uma das lições mais importantes a serem aprendidas. Que não é na simetria, na perfeição, que nós vamos encontrar a verdade, mas, sim, focando nas diferenças que desvendaremos os mecanismos criativos da natureza.

E a relação entre religião e ciência, o senhor acha que esses dois aspectos tão conflitantes podem estar de alguma forma ligados?
Eu acredito que ciência e religião têm, sim, algo em comum. Acho que essa ideia de que existe uma unidade por trás das coisas é um ponto em comum. Essa história de que existe uma teoria final única é uma infiltração monoteísta na ciência. Por outro lado, acredito que essas noções, tanto religiosa quanto científica, estão erradas. Não é por aí que temos de ficar olhando para o mundo, mas é justamente tentando nos distanciar dessas questões abstratas de perfeição. Devemos olhar para o mundo como ele é, e não como gostaríamos que ele fosse.

Sendo assim, a religião não acaba perdendo o seu sentido?
Absolutamente não. A religião continua tendo a sua função. Quem sou eu para criticar as pessoas que acreditam em Deus? Eu acho que todo mundo escolhe no que quer acreditar. Existem dois tipos de pessoas: as sobrenaturalistas, que acreditam que existem explicações sobrenaturais, coisas que vão além do tempo, do espaço e da matéria, como deuses e espíritos; e as naturalistas, que acham que o fato de a gente não conhecer todos os detalhes não quer dizer que tenhamos de evocar entidades sobrenaturais. Já deu pra ver que eu sou um naturalista.

Como é sua relação com a espiritualidade?
As pessoas acham que, porque é cientista, você tem que ser uma pessoa racional, fria, materialista e que nega o valor da espiritualidade, quando é justamente o oposto. Dedicar a vida ao estudo da natureza, para tentar decifrar os mistérios da criação, é uma atitude profundamente religiosa e espiritual. Tenho uma atração muito profunda pela natureza, e o meu trabalho como cientista se reflete nisso. Você pode ser perfeitamente espiritual sem ser uma pessoa religiosa, no sentido ortodoxo da palavra. E eu acho que esse movimento de se entender a espiritualidade da natureza e a nossa relação espiritual com o mundo talvez seja uma nova forma de espiritualidade que esteja emergindo no século 21. Eu acho que essa nova forma de religiosidade vai ser extremamente importante para o futuro da humanidade, porque ela nos liga diretamente ao planeta Terra e à importância da vida.

Em tempos de mudanças climáticas, essa nova forma de espiritualidade pode alterar a maneira que tratamos a Terra?
No meu último livro, eu dedico um capítulo inteiro a uma espécie de manifesto ecológico. Acho que vivemos um novo paradigma, em que o homem se torna o centro do universo, que eu chamo de humanocentrismo. Nós somos seres extremamente raros e preciosos, e temos uma missão extremamente importante, que é a preservação da vida terrestre. Eu acho que nós temos que celebrar a nossa existência e fazer dela uma coisa construtiva para poder salvar este planeta.

O que faz de nós seres tão especiais a ponto de estarmos no centro do Universo?
Antigamente, existia uma noção de antropocentrismo, com origem no período da Renascença, em que o homem foi criado por Deus e que, por isso, a Terra era o centro do Universo, e nós éramos o máximo. Eu digo que não é nada disso. Quer dizer, o que a ciência moderna nos ensinou é que quanto mais a gente aprende sobre o mundo, menos centrais nós ficamos. A Terra não é o centro do Universo, nossa galáxia também não é o centro do Universo, nós somos formados de uma matéria que existe pelo Universo afora, somos criaturas perfeitamente naturais, não existe nada de sobrenatural na gente. Mas, por outro lado, quando a gente estuda a existência de vida em outros planetas, vemos que ela é muito rara. A vida complexa é mais rara ainda. Vida inteligente nem se fala. Isso nos torna extremamente importantes, por sermos seres pensantes no Universo, que é tão hostil. Essa é a temática do humanocentrismo: nós retornamos ao centro das coisas, não porque somos seres sobrenaturais, mas porque somos seres raros, preciosos e que vivem em Universo extremamente hostil à vida.

No livro Cartas a um jovem cientista, o senhor compartilha experiências com jovens que queiram seguir o caminho da ciência. Que mensagem deixaria hoje para eles?
Eu pediria para que eles não se deixassem abater pelo que se diz por aí, que não existe futuro para a ciência, que não existe emprego, porque existe sim. E é muito importante um cientista aprender a resolver problemas relacionados à ciência, mas também aprender a escrever e a falar bem para apresentar as suas ideias. Porque ideias que são boas não são ouvidas, se não forem bem expressas. Isso é uma lição muito importante a ser aprendida para quem quer seguir esse caminho.

domingo, 21 de março de 2010

Os excessos do racionalismo

Erro de Kepler:

19 de março de 2010
Por Marcelo Gleiser

Kepler é popularmente conhecido por sua descoberta das três leis do movimento planetário: as órbitas são elípticas, os planetas varrem áreas iguais em tempos iguais ao redor do Sol, e sua lei harmônica, uma relação matemática entre o tempo que leva para um planeta orbitar o Sol e sua distância dele.

Estas foram as primeiras leis quantitativas da Astronomia, encontrada no livro de Kepler, Astronomia Nova, publicado em 1609, o ano de Galileu apontou seu telescópio para o céu. O que as pessoas não aprendem na escola é o que motivou seu pensamento.(Ou de Galileu ou de Copérnico, ou de Newton, uma verdadeira lacuna em uma pragmática e rígida educação científica. Mas isso é para outro dia.)

Kepler foi um pitagórico verdadeiro, um crente na noção de que o cosmo é, em última análise racional, construído por Deus de acordo com regras geométricas que os homens, através da sua criatividade e dedicação total à filosofia natural, poderiam entender. Nisso, Kepler é talvez o melhor exemplo da metáfora do "espírito de Deus", de que existe uma ordem subjacente à natureza que podemos descobrir, através da aplicação diligente do método científico.

Nisso, Kepler era um homem com um pé na Academia de Platão e outro no futuro: ele acreditava que a Natureza poderia ser entendida a priori, apenas pela mente, embora ele também acreditava que qualquer teoria tinha de ser confrontada com os dados e descartada se não provada correta. Se ele tivesse vivido em sua própria filosofia...

Em 1595, Kepler teve uma visão enquanto palestrava para um punhado de alunos dorminhocos de uma escola Luterana em Graz, Áustria. Ele percebeu que a distância entre Júpiter e o Sol é a metade da distância entre Saturno e do Sol (aproximadamente). Claro que ele sabia disso, mas de alguma forma aquilo o atingiu de novo nesse dia, com um significado mais profundo. Poderia ser uma coincidência? Nunca! Em um universo projetado por um Deus racional não havia coincidências.

Então, ele passou alguns dias tentando chegar a uma formulação geométrica do então conhecido Sistema Solar (só até Saturno). Primeiro, ele queria entender por que havia apenas seis planetas, segundo, como as suas distâncias do Sol foram fixadas.

Em um flash explosivo da intuição, Kepler percebeu que ele poderia aninhar os cinco sólidos platônicos (pirâmide, cubo, octaedro, dodecaedro, icosaedro) um dentro da outro, como bonecas russas, intercalando conchas entre eles. As conchas marcavam as órbitas planetárias, enquanto que a ordenação dos sólidos, fixados pela geometria, determinava as distâncias entre as conchas e, portanto, entre os planetas e do Sol central. Com cinco sólidos, poderia haver apenas 6 esferas intercaladas, uma para cada planeta. Voilà! Voilà!

Kepler se alegrou quando viu um arranjo preciso para cerca de 5%, um feito incrível. Lá estava, uma explicação racional para o cosmo, baseada em geometria! O impacto desta revelação catártica nunca o deixou, mesmo depois que ele usou dados de Tycho Brahe para encontrar as suas leis das órbitas elípticas; com certeza, ele argumentou, as conchas têm alguma espessura e os dados de Tycho, embora grandes, não são perfeitos. Se fossem, ele acreditava, veríamos que o seu modelo geométrico foi correto.

Kepler teria ficado completamente chocado se descobrisse que há mais de seis planetas no sistema solar, e que seu sistema simplesmente não faz qualquer sentido. Ele morreu em feliz ignorância, já que Urano foi descoberto somente em 1781. Ainda assim, as suas leis permanecem válidas e são fundamentais no estudo da Astronomia.

Seu erro foi acreditar irracionalmente a sua visão racional do cosmo, dando-lhe uma finalidade que ele (ou qualquer outra teoria científica a priori) não merecia. Nós podemos muito bem aprender com erro de Kepler, principalmente quando começamos a tomar os nossos modelos e teorias muito além do nível de validação empírica.

Embora existam muitas noções como essas ao redor, nenhuma, é claro, é mais herdeira para este tipo de racionalismo platônico como as versões atuais teorias de supercordas. (Um recente post do co-blogger Adam Frank aborda algumas destas questões.) Confiar em razão humana para descobrir "verdades eternas" é um perigo que é muito fácil sucumbir.

Eu contesto [no sentido de que] temos de olhar para a realidade física com os olhos bem abertos, reconhecendo nossa falibilidade com a humildade que a natureza merece.

2012: O mundo não vai acabar




Certamente, os maias não sabiam nada sobre a fusão nuclear



O ataque é constante, um dilúvio de cataclismos horrendos que marcam o fim do mundo: tudo isso ocorrendo no dia 21 de dezembro de 2012 (ou será no dia 23?). Pelo mundo afora, milhões de pessoas escrevem em blogs, rezam, formam grupos e portais de "informação", acreditando que essas previsões sejam diversas do "bug do milênio" (alguém se lembra?) ou de centenas de outras profecias apocalípticas que falharam e que as pessoas têm uma incrível habilidade de esquecer.

Gostaria de contra-atacar essa onda de medos apocalípticos usando, sim, a luz da ciência e da razão. Mesmo que muitas dessas previsões sejam supostamente baseadas em ciência, a verdade é que não são. Se fossem, deveríamos levá-las a sério (o Sol, é verdade, explodirá em 5 bilhões de anos).

1) Fim do calendário maia: Deixando de lado o fato de que os maias não tinham como prever o fim do mundo, vamos examinar a "evidência" que mostra a relação entre o fim do calendário deles e o fim do mundo.
Os especialistas Linda Schele e David Freidel encontraram referências a eventos ocorrendo muito após o fim do calendário. Outros afirmam que a noção judaico-cristã de apocalipse não fazia parte da cultura maia. A fonte da profecia vem de um local no México chamado Tortuguero.

Especialistas mal conseguem decifrar os fragmentos encontrados lá: "O décimo terceiro [b'ak'tun] termina (no) 4 Ajaw, o 3º do Uniiw [3 K'ank'in]. Preto...ocorrerá. (Será) a queda (?) de Bolon Yookte" K'uh ao grande (ou vermelho?)..." Desse fragmento a uma previsão do fim do mundo baseada no profundo conhecimento cósmico dos maias é um salto vergonhoso.

2) Alinhamento galáctico: Alguns afirmam que os maias sabiam do alinhamento periódico entre o Sol, a Terra e o centro da nossa galáxia. Afirmam também que esse alinhamento causará o fim do mundo. A verdade é que esse alinhamento aproximado ocorre todo mês de dezembro. E a Terra sobrevive há mais de 4 bilhões de anos! Mesmo que todos os planetas se alinhassem -o que não ocorrerá em 2012 ou nas próximas décadas-, o efeito sobre a Terra seria desprezível.

Lembre-se de que a força da gravidade cai em proporção ao quadrado da distância. Se somarmos todas as massas dos planetas, obtemos em torno de 450 massas da Terra. O Sol, sozinho, tem uma massa 332 mil vezes maior do que a da Terra! Ou seja, a perturbação causada pelos planetas ou pelo centro galáctico é irrelevante.

3) Planeta Nibiru (ou Planeta X): Supostamente, os sumérios sabiam de um planeta que vai colidir com a Terra em 2012. Acontece que esse planeta simplesmente não existe! Se existisse, teria já sido detectado por astrônomos. Se fosse colidir com a Terra em 2012, seria visível a olho nu. Um objeto dessa magnitude causaria (pequenas) perturbações em outros planetas e asteroides facilmente detectáveis.

4) Tempestade solar: O Sol tem um ciclo de atividade de 11 anos e o próximo máximo ocorre entre 2012 e 2014. Plasma lançado da sua superfície pode atingir a Terra, causando auroras em altas latitudes. Alguns distúrbios mais violentos podem danificar satélites e causar apagões. O Sol poderia nos causar problemas sérios, mas não há previsão de que isso vá ocorrer em 2012 ou nos próximos milhões de anos.
Certamente, os maias não sabiam nada sobre a fusão nuclear.
Esse frenesi todo é irracional, promulgado por alguns setores dos meios de comunicação e oportunistas. Quem escolhe acreditar nisso está fechando os olhos para 400 anos de ciência, preferindo viver escravizado por medos que pertencem à Idade Média.

sábado, 20 de março de 2010

Em nome da Terra


O astrofísico Marcelo Gleiser propõe que os cientistas abandonem a curiosidade sobre outras formas de vida no universo e busquem soluções para a sustentabilidade do planeta

Hélio Gomes
Ouça a primeira parte da entrevista completa com o astrofísico Marcelo Gleiser, que acaba de lançar o livro
Ouça a segunda parte da entrevista completa com o físico Marcelo Gleiser, que acaba de lançar o livro
Ouça a terceira parte da entrevista completa com o físico Marcelo Gleiser, que acaba de lançar o livro
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TOLERÂNCIA
Para Gleiser, fé e ciência podem conviver em harmonia
Nem a metafísica, nem a fé cega na ciência. Em seu novo livro, “Criação Imperfeita” (Editora Record), o astrofísico brasileiro Marcelo Gleiser prefere uma terceira via na arena de discussões filosóficas sobre o conhecimento. Diferentemente de figuras polêmicas como o biólogo britânico Richard Dawkins – também conhecido como “rottweiler de Darwin” –, que trava uma guerra nada santa contra os criacionistas, Gleiser quer que a comunidade científica abrace a preservação de nosso planeta como missão fundamental para a perpetuação da busca do saber. Ele falou com exclusividade à ISTOÉ em sua sala na Universidade de Dartmouth, nos EUA, onde leciona.
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ISTOÉ – Em “Criação Imperfeita”, o sr. propõe o abandono de questões como “o que nos espera depois da morte?” em favor da sustentabilidade. Trata-se de uma redução nas pretensões da ciência ou de uma correção de rumos?
Marcelo Gleiser – Certamente, de uma correção de rumos. Precisamos acabar com a fixação a respeito de um suposto “código secreto da natureza” e da missão da ciência em desvendá-lo. Isso é uma ilusão construída ao longo de dois mil anos de pensamento monoteísta. A Terra é suficientemente complexa para nos manter ocupados. Não precisamos desse “eldorado”.

ISTOÉ – O sr. critica a arrogância científica em relação aos religiosos e ao planeta em várias passagens do livro. O sr. é arrogante?
Gleiser – Eu nunca fui arrogante (risos). Sei que isso pode parecer paradoxal, já que no livro eu afirmo que muitos estão pensando de forma errada, mas existe uma diferença entre arrogância, pretensão e honestidade. Só estou tentando ser honesto ao abrir uma discussão.

ISTOÉ – O sr. nivela o fervor da busca científica ao religioso?
Gleiser – Albert Einstein já dizia que o impulso dos cientistas em busca de entender o inexplicável é uma questão de fé. A ciência tem uma atração pelo sacro, por entender qual é a nossa relação com o mundo e quem somos nós. A entrega ao conhecimento, científico ou não, é religiosa.

ISTOÉ – O sr. relata encontros com sua mãe depois que ela morreu. Já teve outros tipos de experiências como essa?
Gleiser – Vivi algumas coisas desconcertantes, que desafiam a visão mais racional do mundo. Quando eu era garoto, uma cozinheira tomou todas as bebidas lá de casa. Um dia, meu pai recebeu a visita do ministro da Justiça de Portugal e descobriu a história. Ela foi demitida e partiu dizendo: “Vai acontecer alguma coisa nesta casa!” Pouco depois, quando eu estava estudando para o vestibular, a cristaleira da sala desabou de repente. Mas acredito que o fato de não conseguirmos explicar alguma coisa não faz com que ela seja sobrenatural.

ISTOÉ – Como o sr. analisa a convivência do conhecimento científico com o misticismo típico do brasileiro? Qual é a cara do País nesse sentido?
Gleiser – O brasileiro é muito espiritual. Basta ver a popularidade da astrologia. Talvez o que falte no Brasil seja a percepção de que a ciência pode ser uma fonte para nossa espiritualidade.

ISTOÉ – Seu apelo em nome da preservação do planeta chega no momento em que até mesmo a cultura pop está impregnada pelo tema, graças ao sucesso de “Avatar”. O sr. assistiu ao filme?
Gleiser – Vi e gostei. Há quem pense que ele transforma a mensagem ambientalista em algo trivial. Só critico o envolvimento de uma força mágica no salvamento do planeta Pandora. Precisamos assumir a responsabilidade e não acreditar que a “Mãe Terra” será capaz de nos salvar quando a barra pesar por aqui.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Nascimento Cosmico

Fonte
http://www.hds.harvard.edu/news/bulletin_mag/articles/33-1_gleiser.html

(atenção, esse texto foi traduzido usando o google translator)

Devemos hoje, os cosmólogos ser criadores de mitos para explicar a criação?

por Marcelo Gleiser

Durante o outono de 2004, enquanto em um vôo noturno de Boston a São Paulo para participar de uma conferência sobre cosmologia, eu fui cumprimentado por um casal improvável de objetos celestes alinhados fora da minha janela: a Lua, quase cheia, e Marte, ainda reluzente laranja meses um forte passado seu ponto mais próximo à Terra em 60.000 anos. Sua simetria simples ficou comigo por muito tempo, ressoando com alguma necessidade primordial que todos partilhamos a busca de sentido nos céus. Olhando para uma noite estrelada, é difícil não sentir uma profunda ligação com o cosmos, uma convicção irracional que se intrometer em seus mistérios que nós vamos revelar algo crucial sobre nós mesmos, talvez a nossa verdadeira essência. O fato é que nós tentamos fazer sentido do universo, por uma razão absolutamente egoísta: para dar sentido a nós mesmos. Porque sabemos que sua história é nossa história, e que é maior de todas as histórias.

Nisto não são diferentes dos antigos observadores do céu: Eu não tenho conhecimento de uma cultura que não, através de algumas narrativas míticas, tenta fazer o sentido do céu e do mistério da criação. Yanomamis da Amazônia, Hopis no sudoeste americano, maoris da Nova Zelândia, o Livro do Gênesis, o Enuma Elish babilónico, a dança de Shiva criação, cosmologia relativística moderna, todos dizem, cada um com seu próprio imaginário simbólico e ferramentas, a história do nascimento do primeiro filho, o nascimento do próprio cosmos. A riqueza dessas narrativas é desconcertante. 1 mitos de criação são mantidas como o mais sagrado de todos os mitos, trazendo ordem e sentido à vida das pessoas, integrando sua origem na origem do próprio cosmos.

As crianças, antes do ataque hormonais da adolescência diminui o foco do céu para a virilha, sempre fazer perguntas mítica: "Onde é que o mundo vem? Por que as estrelas brilham? Como é que há tantas pessoas e animais na Terra? O Sobre em outros planetas? " Milan Kundera, em seu romance A Insustentável Leveza do Ser justamente escreveu que as questões mais profundas são aquelas que as crianças perguntam. 2 Por muitas vezes, são perguntas sem respostas, e, como tal, define os limites do conhecimento, alargando os limites do que significa ser humano. Yanomami cosmólogo indiano ou moderna, quando se trata da origem do universo, todos nós nos sentimos como crianças. Uma curiosidade implacável nos impulsiona para frente, uma coceira existencial que deve ser riscado. E riscar o que temos, a melhor maneira que pudermos, da pré-história até hoje.

Depois de ler centenas de mitos da criação, percebi que toda a queda dentro de um sistema de classificação simples, baseado em como cada um responde à pergunta "Será que o mundo passou a ser em um momento específico no passado?" Isto é, "Houve um momento de criação?" A resposta só pode ser "sim" ou "não". Um "sim" significa que o universo tem uma idade finita, assim como nós, que apareceu há algum tempo no passado e ainda está em torno de hoje. Um "não" pode significar duas coisas: ou o universo existiu sempre, um eterno, incriado cosmos, ou ele é criado e destruído em uma sucessão cíclica que se repete ao longo do tempo ilimitado. Os jainistas da Índia rejeitou a idéia de um mundo criado por algum deus ou deuses como mera loucura. Eles argumentaram que se o mundo tivesse sido sempre, os deuses eram desnecessárias.

No hinduismo a Dança do Shiva cria e destrói o mundo em eterna repetição de ciclos. Ambas as idéias, universos incriado e cíclica, ressurgiu na cosmologia do século XX com a teoria de Einstein da relatividade geral, a um usado para estudar o Big Bang. Os germes do que as idéias são essencialmente os mesmos, mítico e científico. É ciência, então simplesmente redescobrir a antiga sabedoria? Soa como um material a lê em incontáveis livros da Nova Era que pretendem encontrar "paralelos" entre a ciência e todos os tipos de misticismo, do Extremo Oriente, Oriente Médio, sudoeste, etc Tempting e rentável, mas não é tão simples. As regras da cosmologia teórica são completamente diferentes das dos mitos de criação sagrada dos hindus e jainistas. Por um lado, modelos cosmológicos devem ser empiricamente validado, testado contra observações astronômicas: no final, só pode haver uma história da criação científica. Mas o que aconteceu antes de um modelo é confirmada, quando só matemática e guiar a intuição física imaginação do cientista? Existe um papel para o mito, então? Isto é onde as coisas ficam mais interessantes. Há apenas um número finito de histórias da criação arquetípica. Eu encontrei cinco no total. O mesmo cinco histórias surgem em todas as culturas, vestidos com as suas próprias cores locais. A ciência passa a ser a narrativa que define a nossa visão moderna do cosmo.

Isso nos leva a mitos que faz escolher um cosmos com um aniversário. A esmagadora maioria dos mitos se enquadram nesta categoria, que podem ser subdivididos em três grupos. Destes, um é de longe o mais popular: mitos da criação, onde o mundo é formado de alguma forma por um deus, deusa, ou um conjunto de deuses. Genesis se encaixa aqui. O cosmo é o resultado de um ato sobrenatural, perpetrado intencionalmente por uma divindade ou divindades.

A principal mensagem desses mitos de criação pode ser resumido como "um de muitos." Cada história da criação pressupõe a existência de algo absoluto, divino ou não, que se transforma ou cria o parente, a realidade em que vivemos, com suas distinções polarizada. Esta dissociação absoluta em relação vale também para os modelos científicos nascimento cósmico.

Claro que, tomados pelo valor de face, um mito onde a criação é o resultado da intervenção divina não ressoam com qualquer modelo de criação científica moderna. Não há tal coisa como fenômenos sobrenaturais na ciência, incluindo a origem do universo: ou as coisas acontecem, e então são passíveis de uma descrição científica, ou não e, portanto, não são a província da ciência. Um fenômeno é, por definição natural. O germe arquétipo de ligação da ciência ao mito aqui é de uma natureza mais filosófica, a noção de unidade como a essência da realidade física, o "a partir de um conceito" muitos ".

em física, a noção de unidade vem da geometria. A idéia de que a essência da natureza é descrita pela matemática é a pedra angular das ciências físicas. Mas a noção de que todos os fenômenos físicos podem ser reduzidos a um único princípio unificador enraizada na geometria não é. Esta crença remonta a Platão, que acreditava que a verdade só poderia ser contemplada dentro do mundo abstrato das formas geométricas. Ecos platonismo fortemente nos escritórios de físicos teóricos, especialmente aquelas preocupadas com questões de origens cósmicas. Stephen Hawking igualou a compreensão da origem do universo a conhecer "a mente de Deus". 3 A metáfora não é acidental. Deus é o geômetra final. É geometria.

Pesquisas de Física para os padrões ordenados na natureza. Cada padrão ordenado é associado com uma simetria específica, como a simetria perfeita de uma esfera ou de seis lados floco de neve. Simetrias também estão presentes na forma como as partículas elementares da matéria, os blocos de construção da realidade física, interagem uns com os outros. Essas simetrias não pode ser visto a olho nu, mas existe muito concretamente na formulação matemática a ditar as leis como as partículas exercem forças uns sobre os outros. Um físico descreve o mundo como composto de partículas elementares da matéria interagem com forças diferentes. Um século de experiências com partículas levou a um resultado notável: todas as manifestações da matéria na natureza pode ser descrita por combinações de apenas doze partículas elementares, agindo sob a influência das quatro forças. Duas dessas forças estão familiarizados-gravidade e do eletromagnetismo. Dois são só ativos dentro do núcleo, as forças nucleares fortes e fracas. Mas é isso aí (pelo menos até agora): doze partículas e quatro forças, cada um com sua simetria associada própria matemática.

Há mais um conceito importante na física moderna, que de um campo. Cada força tem um campo associado a ele. Uma partícula com uma massa possui um campo gravitacional em torno dela. Uma com a carga elétrica tem um campo elétrico em torno dele. Não há nada de fantasmas sobre os campos, embora eles geralmente são invisíveis. Pense nelas como a música, decorrentes de um instrumento que nunca pára de tocar. Assim, se existem quatro forças, existem quatro campos de força, cada um com sua própria simetria matemática.

Podemos agora voltar para a busca da unidade na física. A esperança é que as quatro forças ou campos observados na natureza realmente de uma mola, o campo unificado. Imagine um majestoso rio que se divide em quatro a caminho do mar. Nós vivemos na costa, onde os quatro rios correm os seus cursos distintos. Ninguém nunca nadou o suficiente upstream. Aqueles que tentaram falharam. Mas uma antiga lenda diz que, se pudéssemos, gostaríamos de ver os quatro rios que se fundem em uma só. Esta crença sustenta a cada nova tentativa.

A teoria que tenta unificar todas as forças é conhecido, humildemente, como a Teoria de Tudo (carinhosamente chamado pelos seus requerentes de tep). Einstein passou décadas lutando para quebrar o seu segredo. Centenas de físicos teóricos do mundo dedicam suas vidas profissionais a ela. Embora haja motivos de observação indireta que desenvolva esta ideia, o seu principal combustível é a evidência empírica, mas não uma noção profundamente arraigada platônica de que tudo é um e que é uma geometria. A idéia fundamental é que vivemos num mundo assimétrico, descrito por quatro forças distintas. No entanto, como sonda realidade em energias mais elevadas e alta como nadar contra a corrente, essas forças começam a se comportar mais como uma força única. Em energias extremamente altas, como estava presente apenas durante os primeiros momentos após a criação, todas as forças foram unificados em um só. Neste sentido, se equiparar união com a força criativa do cosmos, a busca de teorias do campo unificado brota da mesma fonte que o "de uma das muitas narrativas" criação. Isso não tirar a beleza eo poder da narrativa científica moderna, que apenas ajuda a contextualizá-lo em uma perspectiva mais cultural.

eu recentemente convidou alex vilenkin, um professor de Física da Universidade de Tufts, para dar um colóquio em Dartmouth. Juntamente com Hawking, Hartle James, e Andrei Linde, Vilenkin é um dos pioneiros da cosmologia quântica, a aplicação das idéias da mecânica quântica ao universo como um todo. Sua colóquio sobre o tema muito controverso de raciocínio antrópico e como ele pode nos ajudar a entender porque o nosso universo é único. Antrópico raciocínio é um nome mais suave para o chamado Princípio Antrópico, que afirma que o universo está do jeito que é porque nós estamos aqui: apenas um tipo muito especial de universo poderia evoluir para ter observadores inteligentes perguntas sobre sua origem e propriedades. Sua premissa é que podemos usar o fato de que nós existimos para aprender coisas quantitativos sobre o cosmo. Vilenkin feita no caso que nós podemos realmente usar o raciocínio antrópico de forma previsível: ele usou para justificar o valor de um componente misterioso da energia do universo chamada "energia escura", cujo efeito bizarro é atuar como uma espécie de anti -gravidade que empurra galáxias distantes distante. Podemos usar o raciocínio antrópico para fixar seu valor, dizendo que se fosse diferente nós não estaríamos aqui? Não aprendemos nada de novo de fazer ciência desta maneira?

Escusado será dizer que os argumentos antrópicos, reuniram-se com muito ceticismo. Em meu livro O Profeta eo astrônomo, 4 Tenho igualado com o equivalente científico de jogar a toalha: aceitando que o universo-é-o-caminho-que-é-assim-que-que-podia-ser aqui, como premissa de partida, a pessoa pára de fazer perguntas realmente fundamentais. Drena a ciência de seu poder preditivo, faz depender a compreensão científica sobre os factos que é suposto explicar e não aceitar passivamente. Nossa existência deve ser o resultado final da ciência, não o seu ponto de partida. O princípio antrópico lugares muita importância para os seres humanos, em ressonância com o "homem é sagrado" argumentos religiosos. Não que Vilenkin ou a maioria dos defensores dos argumentos antrópicos têm uma agenda religiosa secreta. (Alguns o fazem). Muito pelo contrário, eles afirmam que o nosso universo é apenas um de uma coleção infinita de universos onde as coisas conspiraram para produzir vida. Ou seja, estamos apenas caso o estranho lá fora, uma aberração estatística improvável. O perigo é que a partir de argumentos antrópicos para a pergunta "Por que estamos especial?" é um salto bastante automática. As coisas ficam bem confusas na mente de muitos: o universo evoluiu de uma forma muito especial para que nós, como somos únicos, poderia estar aqui. Fala-se de "coincidências cósmicas", onde apenas um universo de idade seriam aptos para a vida, uma vez que leva bilhões de anos para estrelas do tamanho certo para evoluir. Por sua vez, coincidências raça pensamentos de causas por trás deles, e toda a coisa cheira a teleologia, um universo com um propósito. Argumentos antrópicos são preocupantes. Aparentemente, há uma divisão de geração, os mais velhos são mais facilmente atraídos por ela. Pergunte-me em 10 anos.

Nos nossos dias de guerra entre as correntes monoteístas, é refrescante que nos mitos de criação, muitos não assumem um ato de criação de um todo-poderoso ser sobrenatural ou um senso de propósito cósmico como o seu princípio básico. Caso em apreço, o segundo grupo de mitos de criação, com um início afirma que o mundo veio do nada. Não houve deuses, sem tempo ou espaço. De repente, de um desejo primordial de existir, o estouro cosmos à existência por conta própria. Um exemplo desse tipo de mito vem dos maoris da Nova Zelândia: "o engendramento do nada, do nada o aumento...." Criação do nada é também a forma cosmologia moderna descreve a origem do universo. Evidentemente, o "nada" aqui é muito diferente da dos maoris, o que realmente significou a ausência de tudo, inclusive os deuses. O nada da cosmologia moderna é baseada no conceito de vácuo quântico, um nada grávida de incessante atividade criadora.

Tudo começou em 1900, quando Max Planck propôs que a energia de troca átomos da mesma forma troca o dinheiro que nós, em múltiplos de uma quantidade fundamental, o quantum de energia. O quantum do sistema monetário americano é o cento: a cada transação financeira acontece em múltiplos desta unidade de moeda. Antes de Planck, acreditava-se que todos os sistemas físicos, de planetas e bicicletas para gotas de água e átomos, a energia absorvida e emitida continuamente.

Em 1913, Niels Bohr realizado idéia de Planck sobre a estrutura interna dos átomos, que propõe que os elétrons só foram autorizados a circular do núcleo atômico em determinadas órbitas fixas, cada uma com sua própria energia associados, como os degraus de uma escada. Tudo fazia sentido: os átomos só serão trocados em pacotes de energia quântica pouco porque os elétrons só poderia saltar entre os níveis de energia fixo, cada um relacionado a um salto quântico fixa de energia ou um múltiplo dele.

Uma questão ficou, no entanto: por que o elétron não cai no núcleo? Era jovem assistente de Bohr, Werner Heisenberg, que veio acima com uma resposta: o mundo do muito pequeno é marcado por uma incerteza intrínseca que torna impossível saber com precisão em que algo está em um dado momento: se você tentar medir o elétron posição interagindo com ele você acaba colidindo em outro lugar. A medida é para perturbar. É uma propriedade escorregadia do mundo quântico, essa incerteza. Escorregadio e fundamental, pois se você não souber a posição do elétron com precisão, você também não sabe a sua energia. Assim, o elétron não é melhor retratada como uma bola de bilhar pouco, com uma posição bem determinada no espaço, mas como uma onda, como entidade, cuja posição é manchada pelo espaço. Ele não cair no núcleo, porque não pode caber lá. No mundo do muito pequeno há uma agitação quântica residual que nunca vai embora, uma efervescência de ser perpétua. Isto significa que até mesmo o espaço vazio tem oscilações de energia, que o vácuo não é vazio, que não existe tal coisa como o nada absoluto. Traga famoso de Einstein E = mc 2 fórmula, que diz que energia e matéria podem ser inter-conversível, e as flutuações de energia pode realmente criar, mesmo que fugazmente, as partículas de matéria. E se tudo o que existe no universo é energia em diferentes manifestações, estas flutuações podem até mesmo criar inteiro (minúsculo) universos. No mundo quântico, não existe uma fronteira nítida entre o ser eo devir.

Armado com a incerteza quântica, podemos apresentar uma versão de como a criação de fora-de-nada cosmológica narrativa prossegue: "No início, quando o dedo reinou supremo na sua intemporalidade, havia um vácuo quântico, vazio ainda borbulhando de energia evanescente flutuações. Essa sopa primordial estava grávida de um número infinito de possibilidades cósmica, um universo potencial de cada um, cada um cosmóides. E eram de vários tipos. Alguns, mais denso, com energia, cresceu um pouco antes de implodir sobre si próprios, vítimas de seus próprios gravitacional auto-canibalismo. Others, os vazios, expandiu a um ritmo enlouquecido, tornando impossível para puxar inexorável gravidade da questão em conjunto para reunir em estruturas cósmicas tais como as galáxias e estrelas. Mas um cosmóides, talvez mais, passou a ter o equilíbrio de assunto atraente e raspas expansiva um alfinete de pé em sua extremidade, que lhe permita sobreviver por bilhões de anos, a sua dinâmica de processos físicos provocando a evolução das formas de material de complexidade crescente: núcleos, átomos, galáxias e estrelas, planetas e observadores inteligentes. Este cosmóides tornou-se o nosso universo, uma criação do nada quântico, um parto sem causa. "

Há mais um grupo de mitos de criação, com um começo, completando as cinco respostas arquetípico para a criação. Essas narrativas estado que existia antes que o mundo não era o caos, que contemplasse tanto a criação e destruição de tensão instável. Ordem surgiu espontaneamente, e os opostos foram diferenciadas como a criação de desdobradas. Criação implica sempre uma polarização da realidade. Um mito taoísta de antes de 200 aC começa: "No princípio era o caos. Out of chegou luz pura e construiu o céu. A obscuridade pesada, no entanto, mudou-se e formaram a terra de si mesmo...." A formação da Terra é narrado como uma auto-iniciando um processo dinâmico, uma condensação de uma obscuridade pesada. Essa idéia ressoa com descrições modernas de como as galáxias, estrelas e sistemas solares forma como resultado de nuvens de grande contratação da matéria, principalmente hidrogênio e gás hélio polvilhado com os elementos químicos mais pesados. Grandes nuvens de gás contrato devido à sua própria gravidade. Sua rotação faz com que eles adicionaram achatar nos pólos e para alongar no equador, um pouco como massa de pizza quando ele é girado. Manchas lumpier pontos de maior condensação "(densidade) estrelas tornam-se menos, enquanto os planetas irregular. É um mito da criação taoísta científica? Certamente que não, porque não tem nenhuma intenção de oferecer um quantitativo, empiricamente validados, a descrição da realidade. A sobreposição é a mais vagamente sugestiva e no final resultados bem diferentes. O ponto aqui não é o de clipe do âmbito da criatividade científica em um puro nada "encaixe-é-sempre" novo tipo de regime, mas para argumentar que a ciência, pelo menos, que preocupados com questões de origem, pertence a uma tradição intemporal do significado de busca narrativas míticas.

Para ser científica, a cosmologia, no final, deve romper com suas raízes históricas mítico. Mitos não pode ser contestada racionalmente, mas deve ser aceita pela fé. Para um maori, um ianomâmi, um cristão ou literal, o mito é a verdade incontestável, dada por Deus ou xamã-revelado. Outras narrativas míticas são consideradas falsas, sem um momento de hesitação. Não há universalidade na crença. Grande parte da história do mundo foi (e é), escrito como resultado de confrontos entre diferentes credos horrível. A ciência, por sua vez, pretende ser universalmente aceito. Sua força reside em sua ênfase de ter qualquer ideia empiricamente validados por experimentos de laboratório ou observações astronômicas.

Durante os últimos 10 anos ou mais, temos vindo a assistir a uma verdadeira revolução na nossa compreensão do universo, devido a uma série de solo de enorme sucesso baseado e espaço cargo missões. Agora sabemos que o universo é 13800000000 anos de idade, o tempo decorrido desde o início e que a sua geometria é plana ou quase isso. O modelo do Big Bang descreve um universo com uma infância muito denso e quente. Isso muito tem sido empiricamente validada e é um grande triunfo da cosmologia moderna. Quer isto dizer que temos também compreendeu a sua origem, que podemos explicar com confiança, como o universo veio a ser? Não. infância cósmica não é a concepção cósmica. A narrativa moderna cosmológico tem elementos das três classes de mitos com um princípio: a crença em um princípio unificador, o conceito de uma criação a partir do (quantum) nada, ea noção de crescimento a fim de formar cada vez mais complexas estruturas localizadas, como galáxias e estrelas. Até agora, apenas este último aspecto tem se mostrado correta. E sobre a origem do próprio universo? A narrativa do nascimento corrente cósmica, em forma de um modelo matemático do cosmos, o poder preditivo? Pode ser validado como outras teorias científicas, ou estamos lidando com algo novo aqui?

Isto é onde as coisas começam a ficar confuso. É realmente difícil chegar a consequências actuais das coisas que aconteceram durante os batimentos cardíacos primeiro cósmica. Existem alguns possíveis efeitos, mas elas são extremamente difíceis de medir. Talvez as coisas vão mudar no futuro, mas para o momento, a maioria dos modelos de optar pela abordagem do segundo melhor: concordância somente aqueles modelos que levam a um universo com características semelhantes ao que vivemos são aceitáveis. É uma estratégia óbvia. Como escreveu Sir Martin Rees, o astrônomo real da Grã-Bretanha, "[a teoria] deve ser percebido como tendo uma inevitabilidade único sobre ele, um anel retumbante da verdade que obriga parecer favorável." 5 Idealmente, os modelos propostos por cosmólogos não são apenas em conformidade com a mera nosso universo. Devem também prever algo de novo e invisível, talvez um novo tipo de partícula ou radiação que ajudarão a provar que estão certos ou errados. As expectativas são elevadas. Um bestiário fantástico conjunto de possíveis habitantes cósmica tem sido proposto (alguns reconhecidamente deste autor), as consequências de diferentes modelos cosmológicos. Sabemos que eles existem, mas não sabemos ainda o que são. Nossos olhos, porém, telescópica e de outra forma, estão abertas. Não ter todas as respostas é realmente uma coisa muito saudável. É um pré-requisito para aprender mais. Ciência prospera em crise.

No ápice das narrativas plausíveis senta-se a origem do próprio universo. O ponto de partida já sabemos: o nosso universo deve ser único, porque foi um cosmóides fora da sopa primordial quântica que sobreviveram tempo suficiente para casa estrelas, planetas e pessoas. É um conceito geralmente aceite que temos de ser raro, que nunca mais cosmoids crescer em qualquer coisa vale a pena pensar. Pelo menos de acordo com o raciocínio antrópico. Evidentemente, não temos nenhuma idéia se isso é verdade ou não, pois não podemos sair de nossa expansão cosmóides para visitar os vizinhos. O argumento afirma que poderia haver inúmeras, talvez infinitamente muitos, cosmoids lá fora, cada um com seu próprio conjunto de propriedades físicas. Nesse caso, como vimos, o nosso universo, nossa existência, seria o resultado de um acidente de mera estatística. Somos únicos porque nós pertencemos ao pequeno subconjunto de cosmoids que pode abrigar vida. E, talvez mais para o ponto, porque nós somos aqueles que criam as teorias que tentam explicar a nossa existência. Andrei Linde, que abraça o raciocínio antrópico, avançou o conceito de um "multiverso", a meta absoluta entidade que passa a eternidade cosmoids parto, a maioria condenada a um mal-existência, fadado efêmera,. Não sei como essa idéia poderia ser testado. Talvez algumas de suas conseqüências muito indireta poderão, a prova, mas que não seria forte, apenas circunstancial. No início do tempo, a fronteira entre a ciência eo mito fica embaçada.

Significará isto que os cosmologistas tentam explicar criação são criadores de mitos dos tempos modernos? Minha opinião é que não temos escolha, mas para ser criadores de mitos. No entanto, há uma distinção fundamental da fé-mito inventado com base: na cosmologia, os mitos são necessárias apenas para sustentar o processo criativo científico, actuando como catalisadores para a imaginação. Eles estão lá fora, uma distante montanha mágica que deve ser alcançado por enfrentando o território entre os dois. A ciência das coisas boas é o que sai dessa exploração. Se estivéssemos a chegar à montanha, ele deixaria de ser mágico e tornar-se real. Se este objetivo final fosse alcançado, os mitos não teria nenhum papel da esquerda, como iríamos finalmente ter descoberto o modelo racional da realidade que tem todas as respostas. A menos, claro, esta meta-teoria é um Santo Graal. Neste ponto, nós não sabemos. Enquanto isso, a sua imagem luminosa sustenta a pesquisa. Não é por acaso que o Prêmio Nobel de física Steven Weinberg chamou o seu livro que descreve a busca de uma teoria do campo unificado Sonhos de uma Teoria Final. Em suas palavras: "Temos de assumir que consigamos, caso contrário, certamente faltará." 6 O poder de um mito não está em sua realidade, mas na sua credibilidade.

Notas:
Uma valiosa colecção de mitos da criação, com comentários pode ser encontrada em Barbara C. Sproul 's Primal Mitos: Mitos de Criação ao Redor do Mundo (HarperSan Francisco, 1979).
Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser (Faber and Faber, 1984), 139.
Stephen Hawking, Uma Breve História do Tempo: Do Big Bang to Black Holes (Bantam, 1988).
Marcelo Gleiser, o profeta eo astrônomo: Ciência e apocalíptica do Fim do Mundo (WW Norton, 2003).
Martin Rees, antes do início do nosso universo e Outros (Perseus Books, 1997), 159.
Steven Weinberg, Dreams of a Final Theory: The Search for a leis fundamentais da natureza (Pantheon, 1992).

domingo, 14 de março de 2010

Ciência e magia

by Marcelo Gleiser

Esta noite tive um jantar com alguns colegas do departamento de Dartmouth de Religião.Seguiu-se uma conversa interessante sobre a relação entre ciência e magia.Aqui, eu não estou falado de truques de mágica, como coelhos saindo de chapéus ou cartões e moedas, mas a "magia" em um sentido mais sobrenatural.Claro que, à primeira vista, poderíamos pensar que os dois sejam completamente opostos, até mesmo antagônicas.Meu colega Ehud Benor, um estudioso de filosofia e misticismo judeu, fez uma declaração interessante: "a ciência tenta fazer mágica real."Eu tomei isso para mim e comecei a pensar sobre o que ele quis dizer.Em seguida, ocorreu-me que tinha um ponto.
Considere a seguinte lista de feitos mágicos que foram realizados pela ciência (por favor, sinta-se livre para acrescentar):

* Voo: fazemos voar, com máquinas e ou asas anexado.
* Voo espacial: é colocar homens na Lua e ter atingido os confins do nosso sistema solar.
* Vendo o que é invisível para os olhos: através de nossos instrumentos, como vemos o mundo do muito pequeno e muito grande. Vemos também toda a radiação invisível que nos rodeia, infravermelho, ultravioleta, ondas de rádio.
* A comunicação à distância: através do rádio, telefones, telefones celulares, que podem se conectar com pessoas em qualquer lugar do planeta.
* Vendo a distância: com TV e vídeo-telefonando podemos ver além do alcance do olho.
* Luta contra a doença: uma das mais antigas relações entre ciência e magia, a cura do corpo e da mente.
* Destruição: todos sabemos que este.
* Adicione o seu aqui.

A lista é longa. E eu vejo o ponto de Ehud muito claramente. A ciência não faz mágica real. A diferença, claro, é que o poder não emanam de nós directamente, mas através de nossa criatividade e instrumentos. Como tal, a ciência nos torna mágicos através de uma síntese da mente, corpo e ferramentas, em vez de uma equipe encantado para auxiliar no desempenho de truques, temos tecnologia. Como o grande físico Michael Faraday escreveu, nada é tão maravilhoso que não pode ser verdade, contanto que obedece às leis da Natureza.

Criação imperfeita




A noção de que a natureza pode ser decifrada pelo reducionismo precisa ser abolida



Desde tempos imemoriais, ao se deparar com a imensa complexidade da natureza, o homem buscou nela padrões repetitivos, algum tipo de ordem. Isso faz muito sentido. Afinal, ao olharmos para os céus, vemos que existem padrões organizados, movimentos periódicos que se repetem, definindo ciclos naturais aos quais estamos profundamente ligados: o nascer e o pôr do Sol, as fases da Lua, as estações do ano, as órbitas planetárias.
Com Pitágoras, 2.500 anos atrás, a busca por uma ordem natural das coisas foi transformada numa busca por uma ordem matemática: os padrões que vemos na natureza refletem a matemática da criação. Cabe ao filósofo desvendar esses padrões, revelando assim os segredos do mundo.
Ademais, como o mundo é obra de um arquiteto universal (não exatamente o Deus judaico-cristão, mas uma divindade criadora mesmo assim), desvendar os segredos do mundo equivale a desvendar a "mente de Deus". Escrevi recentemente sobre como essa metáfora permanece viva ainda hoje e é usada por físicos como Stephen Hawking e muitos outros.
Essa busca por uma ordem matemática da natureza rendeu -e continua a render- muitos frutos. Nada mais justo do que buscar uma ordem oculta que explica a complexidade do mundo. Essa abordagem é o cerne do reducionismo, um método de estudo baseado na ideia de que a compreensão do todo pode ser alcançada através do estudo das suas várias partes.
Os resultados dessa ordem são expressos através de leis, que chamamos de leis da natureza. As leis são a expressão máxima da ordem natural. Na realidade, as coisas não são tão simples. Apesar da sua óbvia utilidade, o reducionismo tem suas limitações. Existem certas questões, ou melhor, certos sistemas, que não podem ser compreendidos a partir de suas partes. O clima é um deles; o funcionamento da mente humana é outro.
Os processos bioquímicos que definem os seres vivos não podem ser compreendidos a partir de leis simples, ou usando que moléculas são formadas de átomos. Essencialmente, em sistemas complexos, o todo não pode ser reduzido às suas partes.
Comportamentos imprevisíveis emergem das inúmeras interações entre os elementos do sistema. Por exemplo, a função de moléculas com muitos átomos, como as proteínas, depende de como elas se "dobram", isto é, de sua configuração espacial. O funcionamento do cérebro não pode ser deduzido a partir do funcionamento de 100 bilhões de neurônios.
Sistemas complexos precisam de leis diferentes, que descrevem comportamentos resultantes da cooperação de muitas partes. A noção de que a natureza é perfeita e pode ser decifrada pela aplicação sistemática do método reducionista precisa ser abolida. Muito mais de acordo com as descobertas da ciência moderna é que devemos adotar uma abordagem múltipla, e que junto ao reducionismo precisamos utilizar outros métodos para lidar com sistemas mais complexos. Claro, tudo ainda dentro dos parâmetros das ciências naturais, mas aceitando que a natureza é imperfeita e que a ordem que tanto procuramos é, na verdade, uma expressão da ordem que buscamos em nós mesmos.
É bom lembrar que a ciência cria modelos que descrevem a realidade; esses modelos não são a realidade, só nossas representações dela. As "verdades" que tanto admiramos são aproximações do que de fato ocorre.
As simetrias jamais são exatas. O surpreendente na natureza não é a sua perfeição, mas o fato de a matéria, após bilhões de anos, ter evoluído a ponto de criar entidades capazes de se questionarem sobre a sua existência.

sábado, 13 de março de 2010

Marcelo Gleiser investiga discurso ateísta da ciência; leia trecho





















Professor de filosofia natural e de física e astronomia, Marcelo Gleiser é conhecido no Brasil por apresentar temas complexos das ciências de maneira compreensível.

Em seu novo livro, "Criação Imperfeita", Gleiser examina e contesta mais de 2.000 anos de desenvolvimento científico, ao desmontar o maior mito criado pela ciência: a perfeição da Natureza.

Grandes nomes da ciência, como Galileu, Newton, Planck e Einstein, buscaram explicar o Universo em termos de simetria, harmonia e ordem.

O físico esclarece a importância da imperfeição no desenvolvimento do Universo e argumenta que a ciência não é capaz de provar a inexistência de Deus e que jamais poderá explicar a realidade por completo, posição que contradiz Richard Dawkins e outros ateístas radicais.

Para Roald Hoffman, ganhador do prêmio Nobel de química, "Marcelo Gleiser é nosso guia lúcido para onde a beleza é encontrada em um universo imperfeito, assimétrico e acidental."

Colunista da Folha de S.Paulo, Gleiser também é autor de "A Dança do Universo" e "O Fim da Terra e do Céu", ambos vencedores do prêmio Jabuti. Abaixo, leia um trecho do novo livro.

*

Às vezes, para enxergarmos mais longe, temos que olhar por cima dos muros que nos cercam. Durante milênios, magos e filósofos, crentes e céticos, artistas e cientistas vêm tentando decifrar o enigma da existência, convencidos de que a incrível diversidade do mundo natural tem uma origem única, que a tudo engloba. A essência dessa busca é a convicção de que, de alguma forma, tudo está interligado, de que existe uma unidade conectando todas as coisas. Para representar esta unidade, a maioria das religiões invoca uma entidade divina que transcende os limites do espaço e do tempo, um ser com poderes absolutos que criou o mundo e que controla, com maior ou menor arbítrio, o destino da humanidade. Todos os dias, bilhões de pessoas vão a templos, igrejas, mesquitas e sinagogas dedicar preces ao seu Deus, a fonte de todas as coisas. Não muito longe dos templos, em universidades e laboratórios, cientistas tentam explicar as várias facetas do mundo natural a partir de uma noção surpreendentemente semelhante: que a aparente complexidade da Natureza é, na verdade, manifestação de uma unidade profunda em tudo o que existe.

Neste livro, veremos que a crença numa teoria física que propõe uma unificação do mundo material - um código oculto da Natureza - é a versão científica da crença religiosa na unidade de todas as coisas. Podemos chamá-la de "ciência monoteísta". Alguns dos maiores cientistas de todos os tempos, Kepler, Newton, Faraday, Einstein, Heisenberg e Schrödinger, dentre outros, dedicaram décadas de suas vidas buscando esse código misterioso, que, se encontrado, revelaria os grandes mistérios da existência. Nenhum deles teve sucesso. Nos dias de hoje, físicos teóricos, especialmente aqueles que estudam questões relacionadas com a composição da matéria e a origem do Universo, chamam esse código de "Teoria de Tudo" ou "Teoria Final". Será que essa busca faz sentido? Ou será que não passa de uma ilusão, produto das raízes míticas da ciência?

Se, quinze anos atrás, uma vidente me dissesse que um dia escreveria este livro, não acreditaria. Passei meu doutorado e a primeira década da minha carreira buscando por essa elusiva Teoria Final, que unifica tudo o que existe. Não tinha dúvida de que esse era o meu caminho. A candidata mais popular era, e ainda é, conhecida como teoria das supercordas, segundo a qual as partes mais básicas da matéria, os tijolos a partir dos quais tudo é construído, não são pequenas partículas como o elétron, mas tubos submicroscópicos de energia que vibram freneticamente num espaço de nove dimensões. A teoria, de uma elegância matemática extremamente sedutora, deu passos importantes em direção a uma teoria unificada, se bem que, como veremos, continua longe do seu objetivo. Milhares de mentes brilhantes continuam tentando aprimorá-la, enquanto outras trabalham em teorias rivais.

Todas as teorias de unificação baseiam-se na noção de que quanto mais profunda e abrangente a descrição da Natureza, maior o seu nível de simetria matemática. Ecoando os ensinamentos de Pitágoras e Platão, essa noção expressa um julgamento estético de que teorias com um alto grau de simetria matemática são mais belas e que, como escreveu o poeta John Keats em 1819, "beleza é verdade". Porém, quando investigamos a evidência experimental a favor da unificação, ou mesmo quando tentamos encontrar meios de testar essas ideias no laboratório, vemos que pouco existe para apoiá-las. Claro, a ideia de simetria sempre foi e continua sendo uma ferramenta essencial nas ciências físicas. O problema começa quando a ferramenta é transformada em dogma. Nos últimos cinquenta anos, descobertas experimentais têm demonstrado consistentemente que nossas expectativas de simetrias perfeitas são mais expectativas do que realidades.

Mesmo que, inicialmente, minha mudança de perspectiva tenha sido bastante difícil e mesmo dolorosa, aos poucos fui reorientando minha pesquisa para uma nova direção. Comecei a reconhecer que não é tanto a simetria, mas a presença de assimetria a responsável por algumas das propriedades mais básicas da Natureza. Não há dúvida de que a simetria tem o seu valor e continuará sendo extremamente útil na construção de modelos que descrevem a realidade física em que vivemos. Porém, por si só, a simetria é limitada: toda transformação que ocorre no mundo natural é resultado de alguma forma de desequilíbrio. Como explicarei neste livro, da origem da matéria à origem da vida, do átomo à célula, o surgimento de estruturas materiais complexas depende fundamentalmente da existência de assimetrias.

Aos poucos, fui convergindo numa nova estética, baseada na imperfeição. Que me perdoe o grande Vinicius de Moraes, mas beleza não é fundamental. É o imperfeito, e não o perfeito, que deve ser celebrado. Como no famoso sinal de Marilyn Monroe, a assimetria é bela precisamente por ser imperfeita. A revolução na arte e na música do início do século XX é, em grande parte, uma expressão dessa nova estética. É hora de a ciência mudar, deixando para trás a velha estética do perfeito que acredita que a perfeição é bela e que a "beleza é verdade".

Essa nova perspectiva científica tem repercussões que vão muito além das universidades e dos laboratórios. Se estamos aqui porque a Natureza é imperfeita, o que podemos afirmar sobre a existência de vida no Universo? Será que podemos garantir que, dadas condições semelhantes, a vida surgirá em outras partes do cosmo? E a vida inteligente? Será que existem outros seres pensantes espalhados pela vastidão do espaço? De forma completamente inesperada, minha busca científica levou-me a um novo modo de pensar sobre o que significa ser humano: a ciência tornou-se existencial.

Oculta na busca pela unidade de todas as coisas, encontramos a crença de que a vida não pode ser um mero acidente: se forças superiores não tiverem planejado nossa existência, nada faz sentido. Não importa se fomos criados por deuses, como afirmam muitas religiões, ou por um universo cujo objetivo é gerar a vida. De um modo ou de outro, nossa presença aqui tem que ter uma razão de ser. A alternativa seria deprimente: qual o sentido da vida se ela tiver surgido acidentalmente num universo sem propósito? Como consequência, muitos se ofendem quando é sugerido que estamos aqui devido a uma série de acasos: Por que somos capazes de pensar, de amar e de sofrer com tanta intensidade, de criar obras de enorme beleza, se mais cedo ou mais tarde iremos todos perecer e, com raríssimas exceções, seremos esquecidos após algumas gerações? Por que somos capazes de refletir sobre a passagem do tempo se não temos o poder de controlá-la? Não, devemos ser criaturas divinas, ou ao menos parte de um grande plano cósmico. Sermos meramente humanos não pode ser toda a história.

Mas e se formos um acidente, um raro e precioso acidente, agregados de átomos capazes de se questionar sobre a existência? Será que devemos menosprezar a humanidade se não for parte de um "grande plano da Criação"? Será que devemos menosprezar o Universo se não existir um código oculto da Natureza, um conjunto de leis que explica todas as facetas da realidade? Eu diria que não. Pelo contrário, a ciência moderna, ao mesmo tempo que mostra que não existe um grande plano da Criação, põe a humanidade no centro do cosmo. Podemos mesmo chamar essa corrente de pensamento, que proponho aqui, de "humanocentrismo". Talvez não sejamos a medida de todas coisas, como propôs o grego Protágoras em torno de 450 a.C., mas somos as coisas que podem medir. Enquanto continuarmos a nos questionar sobre quem somos e sobre o mundo em que vivemos, nossa existência terá significado.

Vamos considerar esse ponto mais detalhadamente. Após apenas 400 anos de ciência moderna, criamos um corpo de conhecimento que se estende do interior do núcleo atômico até galáxias a bilhões de anos-luz de distância. Ao mergulharmos com nossos maravilhosos instrumentos nos confins do muito pequeno e do muito grande, encontramos uma infinidade de mundos de uma riqueza insuspeitada. A cada passo que demos, a Natureza nos encantou e nos surpreendeu. Com certeza, continuará a fazê-lo. Ao construirmos uma narrativa explicando como, a partir de uma sopa de partículas elementares no Universo primordial, surgiram estruturas materiais cada vez mais complexas, nos deparamos com uma incrível diversidade de formas que jamais poderíamos ter imaginado. A Natureza é muito mais criativa do que nós. Dos muitos mistérios que nos inspiram, talvez o mais instigante seja entender como a matéria inanimada tornou-se viva, e como nossos primeiros ancestrais, minúsculas bolsas de moléculas animadas, transformaram um planeta rochoso num oásis de atividade biológica em meio a um cosmo frio e indiferente.

Vendo a riqueza da vida aqui, e sabendo que as leis da física e da química permanecem válidas por todo o cosmo, voltamos nossos instrumentos para nossos vizinhos planetários, buscando avidamente por companhia. Infelizmente, apesar da convicção de que encontraríamos algo, nos deparamos apenas com mundos mortos. Belos, sem dúvida, mas destituídos de qualquer sinal óbvio de vida. Mesmo que algum ser vivo se oculte no subsolo marciano ou nos oceanos gelados e escuros de Europa, a enigmática lua de Júpiter, certamente terá pouco a ver com seres autoconscientes, capazes de refletir sobre o sentido da vida. Se civilizações alienígenas existirem - a busca por vida extraterrestre inteligente continua - estão tão afastadas de nós que, na prática (e descontando especulações um tanto fantasiosas), é como se não existissem. Enquanto estivermos sozinhos, produtos de acidentes ou não, nós somos a consciência cósmica, nós somos como o Universo reflete sobre si mesmo. Como veremos, essa revelação tem consequências profundas. Mesmo que não tenhamos sido criados por deuses ou por um cosmo com o propósito de gerar criaturas inteligentes, a verdade é que estamos aqui, refletindo sobre a razão de estarmos aqui. E isso nos torna muito especiais.

Nosso planeta, pulsando com incontáveis formas de vida, flutua precariamente num cosmo hostil. Somos preciosos por sermos raros. Nossa solidão cósmica não deveria incitar o desespero. Pelo contrário, deveria incitar o desejo de agirmos, e o quanto antes, para proteger o que temos. A vida na Terra continuará sem nós. Mas nós não podemos continuar sem a Terra. Ao menos não até encontrarmos uma outra casa celeste, o que tomará muito tempo. Basta olhar em torno, para a situação delicada em que se encontra o nosso planeta, para constatar que tempo é um luxo que não temos.

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"Criação Imperfeita"
Autor: Marcelo Gleiser
Editora: Record
Páginas: 368
Quanto: R$ 39,92