domingo, 4 de fevereiro de 2001

A corrida com o tempo

Fora a usual corrida contra o tempo, a corrida com ele, isto é, a marcação cada vez mais precisa da sua passagem, tem uma vastíssima e nobre história. Os egípcios e os gregos usavam a queda d'água para medir o tempo: bastava fazer um furo bem pequeno no fundo de uma moringa e deixar a água gotejar através do furo. Quanto mais cheia a moringa, mais tempo passava.

Era relativamente fácil marcar gradações na moringa, de modo a tornar a passagem do tempo mais quantitativa. Mas a eficiência do relógio d'água era limitada. Em climas mais frios, se a água congelasse ou apenas mudasse de viscosidade, o relógio não funcionava. A solução veio com a ampulheta, que usa o mesmo princípio da passagem de material por um furo. Mas que, em vez de água, usa areia -que, como sabemos, não congela.

O problema ali foi frear a passagem da areia e, também, evitar que a umidade engrossasse a areia e entupisse a ampulheta. Apenas em meados da Idade Média a melhoria nas técnicas de fabricação de vasos de vidro resolveu algumas das dificuldades. O problema foi achar, então, quem ficasse virando a ampulheta durante a noite.

Uma grande revolução na construção de relógios ocorreu no início de 1600, após uma descoberta feita por Galileu Galilei em 1583. Segundo a lenda, Galileu, então com apenas 19 anos, durante uma missa na catedral de Pisa, olhava distraidamente para um candelabro cheio de velas que oscilava regularmente. Medindo o tempo com seu pulso, Galileu percebeu que o período de oscilação do candelabro não dependia da amplitude da oscilação.

Em casa, usando pedras amarradas em cordas, Galileu confirmou sua descoberta e, também, mostrou que o período de um pêndulo independe de sua massa. Pedras grandes ou pequenas, se largadas do mesmo ângulo, irão completar uma oscilação ao mesmo tempo. Galileu não usou suas descobertas para a marcação do tempo, mas o pêndulo transformou os relógios da época, cuja precisão passou de 15 minutos para 10 segundos por dia.

Mas os relógios movidos a pêndulo não eram portáteis e não podiam ser usados em navios, algo que, para potências marítimas como a Inglaterra e a Holanda, era um problema sério. Claramente, um relógio capaz de funcionar em um navio deve ser imune ao balanço das ondas. A solução veio ainda no século 17. Em vez do pêndulo, que usava a força da gravidade para movimentar o mecanismo interno do relógio, bastava usar uma mola que liberava energia armazenada em sua contração.

Em 1761, o inventor John Harrison construiu um relógio que, durante uma viagem de nove semanas da Inglaterra à Jamaica, atrasou apenas cinco segundos. Daí por diante, os relógios não dependiam mais da gravidade e podiam ser portáteis, postos no bolso. Parece que foi Santos Dumont que inventou o relógio de pulso.Mas a corrida pela precisão não parou ali. Os relógios eletrônicos, como os baseados nas vibrações de cristais de quartzo, alcançam precisões que, para o uso diário, são mais do que suficientes.

O cristal de quartzo vibra devido a variações elétricas ao seu redor, que fazem o mesmo papel do adulto que empurra a criança no balanço, sempre do mesmo ponto. As vibrações do cristal, em torno de 10 mil por segundo, produzem pequenos pulsos elétricos que podem acionar os micromotores que movem os braços do relógio ou os painéis de cristal líquido que mostram o tempo.Hoje, os relógios atômicos são os campeões absolutos da precisão. Um relógio de césio perde 1 segundo a cada 30 milhões de anos, uma precisão absolutamente incrível. Seu funcionamento baseia-se na estrutura do átomo, que tem elétrons girando em órbitas fixas ao redor do núcleo.

Quando um elétron pula de uma órbita mais afastada para uma mais próxima do núcleo, ele emite radiação eletromagnética com energia idêntica à diferença de energia entre as duas órbitas, como um pulo entre degraus de uma escada. Para subir de órbita, o életron precisa de energia, fornecida por radiação eletromagnética.

Daí ser possível fazer com que o elétron "vibre" entre duas órbitas com uma frequência extremamente precisa. Se, há 50 anos, o segundo era definido pela rotação da Terra, hoje ele é definido como sendo 9.192.631.770 oscilações do átomo de césio. Não é uma medida muito romântica, mas podemos sempre carregar um relógio de bolso para matar as saudades.

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