sábado, 17 de abril de 2010

A barganha de Fausto




É possível que o poder nuclear leve as civilizações a se autodestruírem


Numa era nuclear, somos a exceção ou a regra? O encontro internacional sobre segurança nuclear, que ocorreu nesta semana em Washington, dá-nos a oportunidade de refletir sobre as causas dessa terrível situação. Considerando que nosso futuro será, em grande parte, determinado por nossa atitude perante a questão nuclear, é bom nos perguntarmos como chegamos até aqui, com o poder de destruir a civilização. O que isso nos diz sobre quem somos como espécie?



Talvez seja útil retornar a um tópico que, à primeira vista, pouco tem a ver com essa discussão ética: a existência de civilizações extraterrestres. No início da década de 1950, enquanto almoçava na lanchonete do laboratório de Los Alamos -o mesmo onde, alguns anos antes, a primeira bomba atômica foi construída-, o grande físico Enrico Fermi parou de comer e perguntou aos seus companheiros: "Onde está todo mundo?".



Seus amigos olharam em torno, procurando quem estava atrasado. "Não, estou falando dos alienígenas. Onde estão eles?"



Com um guardanapo e caneta, Fermi mostrou que, se nossa galáxia tem 10 bilhões de anos e um diâmetro de 100 mil anos-luz, uma civilização que houvesse aparecido, digamos, um milhão de anos antes da nossa teria tido tempo de sobra para colonizar a galáxia por inteiro. Sendo assim, insistiu, onde está todo mundo?



Existem várias respostas para essa questão, conhecida como "Paradoxo de Fermi". A que importa para a nossa discussão de hoje argumenta que os alienígenas não estão aqui porque toda civilização que é capaz de fabricar bombas nucleares se autodestrói. Sem dúvida, uma visão extremamente pessimista da história das civilizações.



Dado isso, devemos nos perguntar se nossa história sob o jugo das armas nucleares nos últimos 65 anos é exceção ou regra. Somos como esses alienígenas suicidas ou mais espertos?



Nossa aniquilação é inevitável ou será que seremos capazes de garantir nossa sobrevivência mesmo tendo em mãos armas de destruição em massa? Infelizmente, armas nucleares são monstros que jamais desaparecerão.



Nenhuma descoberta científica "desaparece". Uma vez revelada, permanece viva, mesmo se condenada como imoral por uma maioria. A barganha faustiana que acabamos por realizar com o poder tem um preço muito alto. É irreversível. Não podemos mais contemplar um mundo sem armas nucleares. Sendo assim, será que podemos contemplar um mundo com um futuro?



O medo e a ganância -uma combinação letal- trouxeram-nos até aqui. Por milhares de anos, cientistas e engenheiros serviram o Estado em troca de dinheiro e proteção. Cercamo-nos de inimigos reais ou virtuais e precisamos proteger nosso país e nossos lares a qualquer preço. O patriotismo é o maior responsável pela guerra. Não é à toa que Einstein queria ver as fronteiras abolidas.


Olhamos para o Brasil, os Estados Unidos e a Comunidade Europeia, onde fronteiras são cada vez mais invisíveis, e temos evidência empírica de que a união de Estados sem fronteiras leva à estabilidade e à sobrevivência. A menos que as coisas mudem profundamente (por exemplo, se São Paulo resolver se separar do resto do país...), é difícil ver essa estabilidade ameaçada. Será, então, que a solução -admito, extremamente remota- é um mundo sem fronteiras, uma sociedade de fato globalizada e economicamente integrada? Ou será que existe outro modo de garantir nossa sobrevivência a longo prazo com mísseis carregando armas nucleares apontados uns para os outros, prontos a serem detonados? O que você diz?

4 comentários:

  1. Marcelo,
    esta possibilidade da destruição nuclear já foi considerada em uma equação sobre a existência de vida fora da Terra desenvolvida pelo astrônomo Frank Drake e comentada por Sagan no seu livro Cosmos. Entretanto, à medida que evoluímos como sociedade, a despeito do terror que uma explosão nuclear possa nos causar como seres físicos, para mim torna-se claro de o aumento da complexidade da estrutura social traz cada vez mais ameaças, muito mais potentes e possíveis que uma guerra nuclear. Por exemplo, somo cada vez mais dependentes de redes de computadores, ao ponto que em algumas situações, metrópoles e sistemas de abastecimento de alimentos inteiros poderiam parar na falta delas. Assim, uma única falha em qualquer ponto de sustentação da nossa malha social global pode levar à morte milhões, talvez bilhões. E quanto mais complexos tornam-se os sistemas que construímos - entenda por sistema qualquer conjunto de processos e operações destinados a suportar determinado objetivo -, mais vulneráveis também são e maior o contingente extra de seres humanos que conseguimos sustentar. Assim, creio que o dilema não se encontra somente no poderio nuclear,mas este concentra sim o gérmen da idéia: quanto um cidadão comum pode possuir de poder nas mãos sem que isto leve a sociedade a um colapso. Ou, será que um dia um ataque de fanatismo de um maluco qualquer poderá paralisar todo o sistema de telecomunicações mundial, por exemplo, e disparar sistema de defesa/ataque automatizados em centenas de locais do globo? Será que poderão comandar milhões de computadores pessoais para gerar recursos financeiros para ataques em qualquer local do globo (para quem acha maluquice, veja o comentário da MCAfee que admitiu na infoexame que há no mínimo 5 redes mundiais de "comptadores zumbis", ou seja, dominados por vírus que eles não conseguem detectar, prontos para obedecer comandos...)? ~
    Ou seja, o cerne da questão é: seremos individualmente cada vez mais poderosos e a malha social cada vez mais complexa e vulnerável. Sobreviveremos com isso? O tempo dirá...

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  2. Acho que o principal a ser feito é admitir que a humaninade realmente caminha para uma direção. Isso de fato parece cada vez mais óbvio, inclusive por exemplos como o das produções nucleares, porém muitos tendem a negar, não os fatos em si, mas a possibilidade deles representarem, como um todo, uma direção única para a humanidade.

    Lembrando que Jung foi capaz de prever a segunda guerra mundial através da análise dos sonhos de seus pacientes.

    E agora?

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  3. Caro Marcelo:

    Esou lendo o seu livro "Criação Imperfeita" em Português.

    Mas uma coisa sempre me chamou atenção:
    Porquê a chamada TEORIA DO TUDO e não TEORIA DO NADA ?

    Afinal de contas, o que importa para essas Teoras Se existisse ALGO sntes ou depois?

    Achar DEUS?

    Bem, tanto faz como tanto fzz!

    Afinal, seu livro é uma ótima oporunidade de nos vermos como realmente somos: Um mero acaso na Evolução.
    agiraldo@uol.com.br

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  4. Acho que gostaria, se ainda não conhece, de ler este autor, especialmente "Stardroppers":
    http://www.fantascienza.com/delos/delos30/brunner.html

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