domingo, 18 de julho de 1999

Ciência e espiritualidade

Nestes tempos "pré-milenares", em que tudo se transforma tão rapidamente, o apetite das pessoas por verdades e certezas mais permanentes vem atingindo níveis jamais vistos ou mesmo previstos. O acesso fácil aos computadores e às telecomunicações criou uma aldeia global, onde a troca de informação entre diferentes culturas e pessoas do mundo é mais fácil e barata do que em qualquer outro período da história humana.

Esse excesso de informação, ao mesmo tempo inspirador e aterrorizador, causa muita confusão e estresse na cabeça das pessoas.

A tecnologia é muitas vezes percebida como uma espécie de monstro, capaz de curas milagrosas e de viagens interplanetárias, mas também de produzir armas que poderiam aniquilar a vida na Terra.

Inevitavelmente, surgem teorias de conspirações clandestinas e o governo (em muitos casos, merecidamente!) perde a sua credibilidade, enquanto uma intolerância generalizada ameaça polarizar ainda mais a sociedade. O resultado é uma sensação de pânico e abandono avidamente explorada por oportunistas que se apresentam como a única alternativa em um "mundo louco".

Com isso, observamos a proliferação de seitas da "Nova Era", de várias superstições (gnomos, anjos, fadas e outras criaturas fantásticas) e de pregadores da "verdade". Observamos também o crescimento do desprezo pela ciência e pelo que ela tem a dizer sobre o mundo.

A ciência é considerada a antítese da espiritualidade, uma atividade fria e manipuladora, dedicada a tirar Deus das pessoas. Ou as pessoas de Deus.

Acredito que essa concepção completamente errônea do que é a ciência e de como ela funciona seja a responsável por sua impopularidade, descontados os fãs, claro. Parte da culpa pertence, sem dúvida, à comunidade científica; historicamente, poucos cientistas dedicaram parte de seu tempo à divulgação, ao público, de suas idéias e descobertas. Essa situação está gradualmente se transformando, mas muito ainda precisa ser feito, especialmente nos meios de comunicação de maior penetração, como a televisão ou o cinema. O que ainda vemos, na maior parte desses veículos, depende do sensacionalismo barato e de distorções da imagem do cientista ou de seu trabalho.

Como, então, podemos reconciliar a ciência com o grande público, fazendo com que sua divulgação não traga, necessariamente, sua distorção? Vários livros de divulgação científica tiveram sucesso por revelar uma conexão entre ciência e espiritualidade, como "O Tao da Física", de Fritjof Capra. A julgar por esses livros, a resposta deve revolver em torno de uma reconciliação entre ciência e espiritualidade. Infelizmente, não creio que o caminho usado por esses autores revele a espiritualidade da ciência de forma correta; não creio que a ciência esteja simplesmente redescobrindo "verdades" descobertas através da meditação ou de uma conexão mística com o mundo, como nas religiões orientais.

A espiritualidade da ciência não é encontrada através de comparações entre suas descobertas e as práticas e ensinamentos de diversas religiões. Ela é encontrada na paixão com que os cientistas devotam toda uma vida na tentativa de desvendar os mistérios do mundo à sua volta. Ela é encontrada no próprio ato criativo, aquele momento de autotranscendência que desafia qualquer explicação racional. Ela é encontrada em sua humanidade e na poesia que revela.

Enquanto a ciência tenta entender o "como", deixando de lado o "porquê", a religião aceita o "porquê" baseada na fé, pouco se preocupando com o "como". Certas questões são exclusivas da ciência, enquanto outras pertencem somente à religião.

O fundamental é saber discernir os limites de ambas, suas diferentes missões e o simples fato de elas serem necessárias para a nossa existência.

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