domingo, 22 de agosto de 1999

O eclipse toral, visto do mar Negro

No dia 11 de agosto, tive o privilégio de assistir a um dos mais espetaculares fenômenos astronômicos: o eclipse do Sol. A universidade onde trabalho, o Dartmouth College, pediu que eu acompanhasse um grupo de ex-alunos em um cruzeiro ao mar Negro, com o objetivo de observar 2 minutos e 21 segundos de "totalidade", quando a Lua cobre inteiramente o disco solar.

A expectativa era enorme. Afinal, um eclipse total não é coisa que acontece todos os dias, nem mesmo todos os anos. O próximo será em junho de 2001. Mas esse foi o eclipse do fim do milênio; profecias apocalípticas não faltavam, usando o eclipse como sinal de que o fim se aproxima, a trombeta do juízo final.

Ao longo dos milênios, a humanidade celebrou eclipses com um misto de fascínio e terror. As imagens variam de cultura para cultura, mas o tema básico é sempre a possibilidade do Sol desaparecer, em geral devorado por algum animal, como uma serpente ou coiote. A escolha do animal devorador depende muito do local onde é criado o mito. Felizmente, algum ser benigno combate o animal esfomeado, salvando o Sol e, consequentemente, a nós também. A luz retorna, as trevas novamente limitadas a sua presença noturna.

Inicialmente, a Lua vai cobrindo aos poucos o disco solar, ou fotosfera, reduzindo o todo-poderoso Sol a uma figura minguante, um discreto sorriso no céu. A temperatura cai, o céu escurece, tingindo-se de um belíssimo azul-metálico. Nos segundos finais antes da totalidade, o observador mais apurado pode ver a sombra projetada pela Lua, se aproximando a 1.500 km/h.

Dois segundos antes da totalidade, o último vestígio de Sol sobre a Lua cria um efeito conhecido como "anel de diamante". Então, com binóculos, pode-se ver as incríveis proeminências solares, jorros de hidrogênio incandescente, de um vermelho profundo, decorando o círculo de luz que circunda a superfície negra da Lua. E do Sol. Embora seja apenas o início da tarde, Vênus e Mercúrio estão perfeitamente visíveis, como pontos de luz solitários em uma noite sem estrelas no meio do dia. A totalidade da cobertura do Sol pela Lua é alcançada.

Em torno do disco negro, pode-se ver a coroa solar, raios de uma luz etérea propagando-se a distâncias de vários diâmetros solares, partículas e gases ejetados da turbulenta superfície solar a incríveis velocidades.

Antes da existência de espaçonaves, a coroa só podia ser observada durante eclipses totais. Como não somos astronautas, eclipses continuarão a ser o único meio terrestre de ver essa luz decorando os céus. O horizonte é sutilmente iluminado por uma luz de tom coral, como se a aurora decidisse não vir mais do leste, mas simultaneamente de todos os pontos cardeais.

Algumas pessoas fotografam e filmam o evento, outras tentam reproduzi-lo no papel, outras gritam, enquanto outras simplesmente olham em silêncio, absolutamente deslumbradas pelo espetáculo astronômico. Tudo isso se deve a uma coincidência, os diâmetros e distâncias relativos entre a Lua e o Sol sempre comparáveis. Caso contrário, a Lua não cobriria o disco solar totalmente, e apenas eclipses anulares, onde vê-se ainda o disco solar em torno da Lua como um anel, seriam possíveis. E mesmo que eclipses anulares sejam também muito belos, nada se compara a um eclipse total.

Passados 2 minutos e 21 segundos, um novo anel de diamante marca o fim do período de totalidade, mais belo ainda do que o que marcou seu início. Um tremor invade meu corpo, minha mente reduzida a um estado primal, impossível de expressar em palavras. O eclipse revela nossa fragilidade, nossa impotência perante as forças que controlam a dinâmica do cosmos. Um silêncio estranho paira sobre o convés do navio, a consciência de que qualquer descrição seria injusta, qualquer comentário incompleto, a certeza de nossa mortalidade atravessada na garganta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário