domingo, 8 de abril de 2001

Poeira das estrelas

Todas as noites, olhamos para o céu (ou se não o fazemos ao menos deveríamos) para confirmar que está tudo tranquilo lá em cima, que as estrelas continuam brilhando pacatamente, que as Três Marias continuam sendo três e não duas ou quatro e que a Lua ainda não nos abandonou. Essa imagem de tranquilidade, escuridão e sossego é um privilégio garantido pelas enormes distâncias cósmicas.

A luz que vem da estrela mais próxima do Sol, a Alfa Centauri, demora mais de quatro anos para chegar até nós e isso viajando a uma velocidade de 300.000 km/s. Não é à toa que a maioria das culturas antigas via o céu noturno como um bastião de regularidade, especialmente se deixarmos de lado os impetuosos planetas e cometas.Mas o céu não tem nada de pacato. Muito pelo contrário, se existe uma palavra que possa resumir a natureza física do cosmo, ela tem de ser transformação.

Na natureza, abreviando o dito do grande químico francês Lavoisier, tudo se transforma. E os grandes motores das transformações cósmicas -da criação e da destruição de mundos, da geração de elementos químicos que aparecem em planetas, sapos e pessoas- são as explosões que marcam o fim da vida das estrelas. Pode parecer estranho falar em vida das estrelas, como se elas fossem seres vivos, mas a verdade é que a analogia é muito apropriada. Estrelas também nascem, evoluem e morrem, e desse ciclo nascem outras estrelas e outros mundos. Podemos até imaginar que as estrelas são uma espécie de reciclador de material cósmico.

A partir de hidrogênio e um pouco de hélio, elas geram praticamente todos os outros elementos do Universo. Em outras palavras, o ferro, o carbono, o ouro e o urânio que encontramos aqui na Terra e em nossos corpos vieram da explosão de uma estrela em nossa vizinhança cósmica há 5 bilhões de anos.Quando uma estrela com massa superior a oito massas solares esgota o seu combustível nuclear, o seu fim é uma questão de pouco tempo. Em breve, ela será destruída por uma explosão de uma violência indescritível, liberando uma energia equivalente a 10 mil trilhões de trilhões de megatoneladas de TNT. (Ou, em notação mais compacta, 1028 megatoneladas de TNT). Como comparação, uma bomba nuclear produz algumas megatoneladas de TNT.

Uma supernova, como é chamada a estrela moribunda, pode brilhar mais intensamente do que toda uma galáxia contendo bilhões de estrelas.A energia gerada no coração das estrelas vem da transmutação entre os elementos químicos que ocorre através da fusão nuclear. Durante a fase mais longa da vida da estrela, hidrogênio funde-se em hélio, tal como no Sol hoje, contrabalançando a contração gravitacional forçada continuamente por suas camadas mais externas.

Eventualmente, o hidrogênio no coração da estrela se esgota, e hélio é fundido em carbono. A gravidade vai tentando comprimir a estrela ainda mais, e ela funde o que pode para resistir a sua própria implosão. A uma certa altura, o processo deixa de ser eficiente, as camadas externas da estrela despencam sobre a sua rígida região central e são ricocheteadas para o espaço sideral com velocidades que chegam a 50.000 km/s. Com isso, todos os elementos químicos que estavam sendo "cozinhados" no interior da estrela são espalhados pela sua vizinhança, como sementes em um jardim.

As supernovas irrigam o espaço à sua volta com os elementos químicos que darão origem a outros mundos.A cada segundo, uma supernova detona em alguma parte do Universo. Em nossa galáxia, temos de esperar de 30 a 50 anos para presenciar tal evento. Às vezes, uma explosão ocorre próxima o suficiente para ser observada a olho nu. Mas, nos últimos 2.000 anos, apenas seis foram registradas. A mais espetacular apareceu em 1054 na constelação do Touro.

Segundo registros do Observatório Imperial de Pequim, na China, essa supernova foi visível durante o dia por três semanas e à noite por um ano, desaparecendo tão misteriosamente quanto ela apareceu. Certamente, para os astrônomos imperiais e os outros observadores celestes que presenciaram essas aparições, as estrelas novas deviam ser mensagens dos deuses. E para nós? Talvez a sua mensagem mais importante seja a profunda união de todas as coisas cósmicas: que nós, como tudo o mais no Universo, somos poeira das estrelas.

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