domingo, 4 de julho de 2004

As formigas, o grilo e as dimensões escondidas

Uma formiga, andando sobre um fio, não tem muita escolha, a não ser andar para frente ou para trás. Uma outra, andando sobre uma bola sempre na mesma direção, irá caminhar em círculos fechados, voltando sempre ao seu ponto de partida.

Em sua inocência de inseto, ela não se dá conta de que está repetindo o mesmo trajeto, espantada, após horas de caminhada carregando uma pesada folha, de como se afastou do formigueiro. De repente, alguém chuta a bola, e formiga e folha voam até bater no fio onde está a outra. Caem as duas no chão e, felizes da vida, percebem que podem se locomover outra vez em duas direções, norte-sul, leste-oeste. "Que alívio, achei que ia ficar sempre andando em linha reta, sem saber como chegar ao formigueiro", diz a primeira. "E eu?" -diz a outra-, "caminhei, caminhei e não sabia aonde estava indo, pois tudo parecia igual."

Um grilo, passando pelas duas, escuta a conversa. "Vocês formigas são muito burras mesmo", diz ele, saltando alegremente sobre as duas. "Aliás, burrice é uma característica de seres bidimensionais. Nós, grilos, somos privilegiados, pois podemos pular, além de andar. E eu digo para vocês, nada como um bom pulo para se sentir em paz com o mundo."

As formigas olham uma para a outra, batem as antenas e resolvem ir embora sem dar bola para o pretensioso grilo. "Que grilo mais metido, só porque ele pode pular, e nós, não, ele se acha todo importante", diz uma delas. "É, grilo é assim mesmo", responde a outra.

Na volta ao formigueiro, elas se deparam com uma árvore tombada. O tronco, já corroído, formava um túnel. Elas resolvem entrar para ver se encontram pulgões para o almoço. "Olha só que engraçado, se eu andar para frente e para trás, esta árvore é igual ao fio onde eu estava", diz uma. "É mesmo", responde a outra. "Se eu andar para o lado, acabo voltando ao ponto de onde comecei, feito o lugar onde eu estava antes."
O grilo, que seguiu as duas, entra pulando dentro do tronco. "Eta burrice, vocês nunca viram um cilindro? Ci-lin-dro. Em uma direção é reto e na outra é fechado, como um círculo."

"Ih, grilo, deixa a gente em paz, tá?" -diz uma formiga. "Nós temos muito o que fazer." O grilo sai pulando, balançando a cabeça.
Um físico e seu filho de oito anos estavam passeando pela mesma floresta. "Filho, você sabe que nós vivemos em três dimensões, certo? Norte-sul, leste-oeste, em cima e embaixo. Olha só aquelas duas formigas. Elas só andam em duas dimensões e nem sabem que existe uma terceira. Já aquele grilo ali, pulando sobre as duas, sabe que existem três."

O menino, muito esperto, responde: "Pai, é como a gente. No carro, andamos em uma dimensão, para frente ou para trás. Em um barco, andamos em duas. E em um avião, em três."

O físico olha para o filho, todo orgulhoso. "Isso mesmo! Filho, tenho uma idéia. Vamos confundir aquele grilo. Eu trouxe aqui um cano tão fino que ele não vai ter espaço para pular dentro dele. Põe ele dentro." O garoto pega o grilo e empurra o coitado para dentro do cano.

As formigas, que estão de longe assistindo à cena, rolam no chão de rir. "E agora, seu grilo?" -diz uma-, "você vai pular aí dentro também?" O grilo, humilhado, tenta atravessar o cano com o máximo de dignidade. O físico pega outro cano, ainda mais fino. O menino logo exclama: "Ô pai, esse aí é fino demais, nem as formigas dão dentro."

"Exatamente", diz o físico. "Mesmo que o cano seja perfeitamente real, nem as formigas nem o grilo poderão explorar o seu interior. Para esses insetos, o cano fino é uma dimensão invisível."

"Quer dizer que é possível que existam dimensões invisíveis para nós também, tão pequenas que não podemos explorá-las?" -pergunta o menino. "Exatamente, filho. Existem teorias que dizem que o espaço tem dez dimensões, e não três. As seis dimensões extras são tão pequenas que não podemos vê-las. O que não significa que elas não existam. Veja só."

O físico pega uma aranha bebê, bem pequenina, e a põe dentro do cano fino. Após alguns segundos, ela sai pelo outro lado, feliz da vida. "Para essa aranha, o mundo dentro do cano é perfeitamente real." O menino olha para o pai, desconfiado. "Mas por que dez dimensões, pai? E por que só três são grandes?" O físico sorri. "Ah filho, isso a gente vai ter de deixar para um outro passeio pela floresta."

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