domingo, 20 de abril de 2008

A lua está sempre no céu?



John Wheeler foi uma mistura de artesão, matemático habilidoso e poeta

Essa foi a pergunta que Einstein fez ao então jovem professor de física da Universidade de Princeton John Wheeler.


Einstein criticava a posição da física quântica, que estuda as propriedades dos átomos e das partículas subatômicas, segundo a qual apenas por meio do ato de medir podemos inferir a existência de alguma coisa: no caso, a Lua só existe se alguém a observar. Claro, Einstein estava sendo sarcástico, tentando expor a posição paradoxal do mundo quântico em que a realidade é determinada pela interação entre o observador e o observado.

Só podemos afirmar que um elétron existe ao medirmos suas propriedades. Imagino que Wheeler, que foi aluno do também legendário Niels Bohr - um dos pioneiros da física quântica -, tenha insistido que, no caso dos átomos e das partículas, a situação era estranha mesmo. Wheeler, que morreu na semana passada aos 96 anos, foi um dos grandes nomes da física do século 20, testemunha de acontecimentos que mudaram a história.

Freeman Dyson, outro monstro sagrado da física que felizmente ainda está vivo, encontrou o melhor modo de definir Wheeler: uma mistura de artesão, matemático habilidoso e poeta. Wheeler foi um daqueles raros cientistas visionários, capazes de enxergar os caminhos futuros da física antes de seus colegas.

Um exemplo disso foi o modo como ele, nos anos 1950, transformou o estudo da teoria da relatividade geral de Einstein em algo aceitável no currículo de física. A teoria, devido às poucas observações e testes acessíveis na época, estava relegada ao quase esquecimento.

Wheeler começou a ensinar relatividade geral em Princeton, influenciando toda uma geração de físicos teóricos. Dentre eles, o grande físico brasileiro Jayme Tiomno, que obteve vários resultados fundamentais quando trabalhou com Wheeler.

Outra característica de Wheeler era sua habilidade de combinar idéias de áreas diferentes, criando algo novo.

No final dos anos 1930, junto com Bohr, visualizou o núcleo atômico como uma gota. Quando a gota era atingida por um nêutron, ela se dividia (fissionava). Essa idéia explicava de forma simples o processo de fissão nuclear, que está por trás da bomba atômica e da geração de energia em usinas como Angra 2, no litoral do Rio. Wheeler trabalhou no Projeto Man-hattan, que desenvolveu a bomba atômica entre 1942 e 1945, e mais tarde no desenvolvimento da poderosa bomba de hidrogênio, motivado por um patriotismo que incomodou vários de seus colegas mais liberais.

Talvez sua contribuição mais popular seja ter inventado o nome "buraco negro" para designar o estado final do processo de colapso gravitacional sofrido por estrelas com massas bem maiores do que a do Sol.

O nome, aparentemente, foi inspirado por uma pergunta durante uma palestra que Wheeler deu em Nova York no ano de 1967. Quando uma estrela chega ao fim de sua vida, implode sobre si mesma com tremenda violência. A gravidade à sua volta aumenta de tal forma que nem mesmo a luz pode escapar: o resultado é um buraco no espaço, de onde nada (ou quase nada) sai. Daí o nome.

Lembro-me de uma conferência em Princeton em 2003, celebrando seu nonagésimo aniversário. Wheeler ouviu as várias apresentações, inclusive a minha, em completo silêncio.
Ao fim, levantou-se e, com voz trêmula, agradeceu a todos os presentes. Declarou sua tristeza em ver o mundo divido em cruzadas religiosas e previu que uma grande conflagração ocorreria antes de chegarmos à paz. Espero que essa sua última previsão esteja errada.

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