sábado, 2 de janeiro de 2010

A pressa do tempo




A assimetria na qual o presente vira passado é a marca do cosmo e da vida


Oano de 2009 passou. Para mim ao menos e, imagino, para muitos leitores, passou rápido demais. Aconteceram tantas coisas nesse ano quanto nos outros -talvez um pouco mais ou um pouco menos-, mas a percepção que temos é de que foi tudo mais rápido, que o tempo parece estar com pressa, atrasado para chegar a algum lugar.
 
Volta e meia, alguém me escreve perguntando se o tempo pode passar mais rápido. A questão é interessante, já que envolve nossa percepção do tempo psicológico e como ela difere da representação do tempo físico.
 
O tempo é uma medida de mudança. Se nada ocorre, o tempo se faz desnecessário. Portanto, no plano pessoal, percebemos a passagem do tempo nas mudanças que ocorrem à nossa volta e na nossa pessoa. O que torna a discussão interessante é que a "percepção" da passagem do tempo não precisa ser através dos cinco sentidos, como é o caso de outras percepções. Por exemplo, podemos determinar se algo está quente ou frio, perto ou longe, claro ou escuro, barulhento ou quieto, doce ou salgado, usando os nossos sentidos. Mas se nos isolássemos completamente, de modo a bloquear qualquer tipo de sensação sensorial de fora para dentro, ainda poderíamos perceber a passagem do tempo através dos nossos pensamentos. Na nossa cabeça, o tempo nunca para.
 
Dizem que a geometria veio das medidas de distância e os números vieram da passagem do tempo. Sendo assim, a percepção do tempo é ligada à à passagem: existe uma ordenação de eventos, coisas que acontecem uma após as outras. Os números nos ajudam a contá-las e à pô-las em ordem. Mas, para que seja possível ordenar eventos -o que vem antes de quê- precisamos lembrar o que ocorreu.
 
Logo, a percepção do tempo depende fundamentalmente da memória. Se nossas memórias desaparecessem por completo, nossa percepção da passagem do tempo se transformaria: voltaríamos a ser como bebês, e cada dia seria imensamente longo, cheio de memórias sendo acumuladas, baseadas nas tantas novidades que a vida oferece. Quanto mais temos para descobrir, mais memórias para criar, mais devagar o tempo passa. Na verdade, o tempo passa sempre do mesmo jeito, segundo após segundo. Mas nossa percepção dessa passagem depende do nível de envolvimento que nosso cérebro tem com a experiência que estamos tendo. A relatividade psicológica da passagem do tempo depende de quão nova a experiência é. Rotinas, a falta de novidade, faz com que o tempo acelere.
 
Na física a situação é diferente. O tempo é uma quantidade fundamental, que não pode ser definida em termos de outra quantidade. Um segundo, a unidade universal de tempo para a humanidade, é definido como sendo 9.192.631.770 oscilações entre dois níveis do átomo de césio-133. Bem diferente do tique-taque dos relógios mecânicos, que não são muito confiáveis. Einstein, explicando a relatividade de forma coloquial, disse uma vez que se estamos ao lado de uma bela garota, uma hora passa em um segundo; se pomos a mão no fogão quente, um segundo parece ser uma hora.

Vemos a passagem do tempo se manifestando nos céus a cada dia, dada a periodicidade dos fenômenos astronômicos. A expansão do Universo, quem vem ocorrendo há 13,7 bilhões de anos, mostra que mesmo no nível cósmico existe uma direção bem definida de tempo, do passado ao futuro. Essa assimetria do tempo, na qual o presente vira passado e o futuro vira presente, é a marca do cosmo e da vida. Se quisermos desacelerar sua passagem, é bom criarmos experiências novas. Por exemplo, aprender a tocar um instrumento ou estudar física.

2 comentários:

  1. Bom dia Marcelo. Muito bom, achei ótimo o seu texto. Tem um poema que parece uma espécie de receita para demorar o tempo. Acho muito bacana, se por acaso você ainda não conhece, ai vai. Abraços.


    Mude
    De Edson Marques.

    "Mude,
    mas comece devagar,
    porque a direção é mais importante
    que a velocidade.

    "Sente-se em outra cadeira,
    no outro lado da mesa.
    Mais tarde, mude de mesa.

    "Quando sair,
    procure andar pelo outro lado da rua.
    Depois, mude de caminho,
    ande por outras ruas, calmamente,
    observando com atenção
    os lugares por onde você passa.

    "Tome outros ônibus.
    Mude por uns tempos o estilo das roupas.
    Dê os seus sapatos velhos.
    Procure andar descalço alguns dias.

    "Tire uma tarde inteira
    para passear livremente na praia,
    ou no parque,
    e ouvir o canto dos passarinhos.

    "Veja o mundo de outras perspectivas.
    Abra e feche as gavetas
    e portas com a mão esquerda.

    "Durma no outro lado da cama...
    depois, procure dormir em outras camas.

    "Assista a outros programas de tv,
    compre outros jornais...
    leia outros livros,
    Viva outros romances.

    "Não faça do hábito um estilo de vida.
    Ame a novidade.
    Durma mais tarde.
    Durma mais cedo.

    "Aprenda uma palavra nova por dia
    numa outra língua.
    Corrija a postura.
    Coma um pouco menos,
    escolha comidas diferentes,
    novos temperos, novas cores,
    novas delícias.

    "Tente o novo todo dia.
    o novo lado,
    o novo método,
    o novo sabor,
    o novo jeito,
    o novo prazer,
    o novo amor,
    a nova vida.

    "Tente.

    "Busque novos amigos.
    Tente novos amores.

    "Faça novas relações.

    "Almoce em outros locais,
    vá a outros restaurantes,
    tome outro tipo de bebida
    compre pão em outra padaria.
    Almoce mais cedo,
    jante mais tarde ou vice-versa.

    "Escolha outro mercado...
    outra marca de sabonete,
    outro creme dental...
    tome banho em novos horários.

    "Use canetas de outras cores.
    Vá passear em outros lugares.
    Ame muito,
    cada vez mais,
    de modos diferentes.

    "Troque de bolsa,
    de carteira,
    de malas,
    troque de carro,
    compre novos óculos,
    escreva outras poesias.

    "Jogue os velhos relógios,
    quebre delicadamente
    esses horrorosos despertadores.


    "Abra conta em outro banco.
    Vá a outros cinemas,
    outros cabeleireiros,
    outros teatros,
    visite novos museus.

    "Mude.

    "Lembre-se de que a Vida é uma só.
    E pense seriamente em arrumar um outro
    emprego,
    uma nova ocupação,
    um trabalho mais light,
    mais prazeroso,
    mais digno,
    mais humano.

    "Se você não encontrar razões para ser livre,
    invente-as.
    Seja criativo.

    "E aproveite para fazer uma viagem
    despretensiosa,
    longa, se possível sem destino.

    "Experimente coisas novas.
    Troque novamente.
    Mude, de novo.
    Experimente outra vez.

    "Você certamente conhecerá coisas melhores
    e coisas piores do que as já conhecidas,
    mas não é isso o que importa.
    O mais importante é a mudança,
    o movimento,
    o dinamismo,
    a energia.
    Só o que está morto não muda!

    "Repito por pura alegria de viver:
    a salvação é pelo risco, sem o qual a vida
    Só o que está morto não muda!

    "'Repito por pura alegria de viver:
    a salvação é pelo risco,
    sem o qual a vida não vale a pena.'"

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  2. Interessantíma postagem e tive que ler mais de uma vez ( sou meio burrinha).
    E novamente, percebo que não percebo o tempo - não só porque ele é mais rápido agora mas porque eu nunca estive no tempo certo.
    E odeio calendários mas tenho consciência de que estou eu a passar.
    Obrigada.

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