domingo, 4 de abril de 1999

Uma breve história do calendário

Com a aproximação iminente do novo ano, século e milênio, nada mais apropriado do que darmos uma olhada na grande aventura que foi a elaboração de um calendário aceito globalmente. Claro, certas culturas e religiões não ligam para essa passagem de milênio, já que, para elas, a passagem do tempo é assinalada de modo completamente diverso. Antes de entrarmos na história do calendário aceito hoje, o Gregoriano, vale a pena visitarmos outros ainda em uso.

Para os judeus, o calendário começa no dia em que o Universo foi criado, segundo o Gênesis, no Antigo Testamento. O segundo milênio começou em 1761 a.C., uma data sem significado para o calendário Gregoriano ou para os judeus. Aliás, segundo Benjamin Gampel, professor de Estudos Medievais do Seminário Teológico Judaico de Nova York, para os judeus, o início de mais um milênio não é celebrado de forma mais especial do que outros anos. Já para os muçulmanos, a passagem do tempo é medida em ciclos lunares medidos a partir da fundação da primeira comunidade islâmica, em Medina, na península Árabica, pelo profeta Maomé. O ano 2000 dos muçulmanos cairá em 2562 no calendário Gregoriano.

Nem tampouco o dia coincide. A passagem do Ano Novo será celebrada pelos muçulmanos nesse ano no dia 11 de abril, se a Lua crescente for avistada, anunciando o novo mês lunar. Caso contrário, o Ano Novo será no dia seguinte. Já os chineses celebraram o Ano Novo no dia 17 de fevereiro, e os judeus irão celebrá-lo no dia 11 de setembro.

Desde as primeiras comunidades agrícolas, marcar a passagem do tempo sempre foi uma atividade muito importante. A própria sobrevivência da comunidade dependia do conhecimento de quando plantar ou colher, ou quando chegam as chuvas ou a seca. A regularidade desses eventos foi equacionada com a regularidade dos movimentos celestes; o céu podia ser usado como um gigantesco relógio, impulsionado pelos deuses. Para adicionar significado a esses eventos naturais, sua chegada era marcada por festivais religiosos, em que a comunidade se reunia para celebrar mais um ano de fartura ou para apaziguar os deuses na esperança de um ano melhor. O calendário passou a ser identificado com eventos religiosos, criando uma aliança que persiste até hoje.

O problema ao criar um calendário simples é que o céu não se presta a nossa contagem em números inteiros. Por exemplo, o intervalo entre dois ciclos lunares é de 29,53 dias, o que faz com que um mês lunar tenha 29 (ou 30 dias), e um ano lunar (12 meses lunares), um total de 354,36 dias, menos do que um ano solar, de 365,2422 dias.

Essas inconsistência e outras fizeram com que Julio César promovesse uma reforma no calendário. Para corrigir o problema, ele decretou que o ano 46 a.C. tivesse 445 dias e que todos os anos seguintes tivessem 365. A cada quatro anos, um dia seria adicionado ao mês de Fevereiro, que teria então 29 dias. O calendário Juliano criava um excesso de três anos "bissextos" a cada 385 anos, provocando uma discrepância na datação dos equinócios e solstícios. Como o equinócio do outono (primavera no Hemisfério Norte) marca o início da Páscoa, a Igreja resolveu interferir. Ao lado do astrônomo Clavius, o Papa Gregório 13 inaugurou um novo calendário, o "Gregoriano", decretando que quinta-feira, 4 de outubro de 1582, no calendário Juliano, seria seguida por sexta-feira, 15 de outubro, no calendário Gregoriano. Onze dias desapareceram da história por decreto papal!

Como a reforma veio da Igreja Católica, nem todos ficaram muito satisfeitos. A Inglaterra só adotou o calendário Gregoriano em 1752, enquanto os protestantes na Alemanha acreditavam que o novo calendário era obra do diabo. Confusões e disputas religiosas resolvidas, a contagem continua em direção ao novo milênio, que, mesmo arbitrário, não deixa de ser emocionante.

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