domingo, 14 de novembro de 1999

Um mundo imerso em ondas



Ondas estão por toda a parte. Nós ouvimos porque ondas de som se propagam pelo ar, fazendo vibrar o delicado mecanismo dentro de nossos ouvidos. Quando vemos algo, nossos olhos estão captando ondas luminosas refletidas pela superfície do objeto. Os processos neuronais que traduzem esses estímulos externos em sensações são ainda objeto de muita pesquisa. Mas sabemos que os neurônios responsáveis por essa "tradução" funcionam devido à propagação de ondas elétricas pelos axônios. O mapa de realidade externa que é reconstruído em nosso cérebro é o resultado da propagação e interação de diversos tipos de ondas. Mas o que é uma onda?

Por incrível que pareça, essa pergunta tem várias respostas. Fundamentalmente, a existência de ondas deve-se ao amor que a natureza tem pelo equilíbrio estável; quando um sistema em equilíbrio é levemente perturbado, ele tenderá naturalmente a voltar à condição de equilíbrio. A superfície de um lago, ou de uma banheira cheia d'água, permanece intacta, a menos que algum estímulo externo perturbe esse equilíbrio. Rapidamente, ondas concêntricas se propagam a partir do ponto de contato, e a energia extra depositada ali é então dissipada: o sistema volta ao equilíbrio. Portanto, podemos dizer que ondas são uma propagação organizada de um desequilíbrio.

Em geral, ondas são resultados de perturbações lineares, ou seja, que provocam uma resposta proporcional ao estímulo: um estímulo duas vezes maior provoca uma resposta do sistema duas vezes maior. Quando o problema é formulado matematicamente, as soluções das equações representam as ondas que observamos no lago.

Nem todo estímulo gera uma resposta linear. Vários sistemas são dominados por efeitos não-lineares, em que um pequeno estímulo pode gerar uma resposta muito intensa e vice-versa, sem uma relação simples entre os dois. Um exemplo dramático é o de uma onda quebrando na areia. No mar, vemos ondas na superfície com períodos de cinco a dez segundos; esse regime é essencialmente linear.

Quando essas ondas se aproximam da praia, a menor profundidade aumenta a influência de termos não-lineares. A amplitude da onda aumenta, sua velocidade diminui e, não podendo mais se sustentar, ela quebra, fazendo com que o movimento organizado se torne turbulento. Mas seria prematuro concluir que toda a não-linearidade leva à destruição de ordem. Em certos sistemas, é justamente a não-linearidade que provoca a manutenção da onda, compensando exatamente sua tendência natural de se dispersar, como uma espécie de cola. Essas configurações estáveis e não-lineares são conhecidas como sólitons.

Em 1834, o engenheiro inglês J. Scott Russell relatou seu encontro com um sóliton, ou onda solitária: "Estava observando um barco puxado por dois cavalos em um canal estreito, quando os cavalos pararam subitamente. Uma massa de água formou-se em torno do barco e começou a se propagar a uma alta velocidade (15 km/h), uma formação solitária e elegante, que viajou pelo menos por dois ou três quilômetros, até eu perdê-la de vista."

Hoje vemos sólitons em praticamente todas as áreas da física, desde a propagação de sinais em fibras óticas e domínios magnéticos em vários materiais até a condução de certos impulsos nervosos. A não-linearidade também pode trazer a ordem. Claro, ondas não são restritas ao mundo visível. Átomos e partículas de matéria e de radiação (ou, no visível, luz) também são descritos por ondas. Essas "ondas de matéria" não sofrem dissipação como as ondas no mundo visível à nossa volta: a mecânica quântica mostra que ondas de matéria nunca param por si só. Talvez exista uma relação profunda entre ondas e nosso conceito de tempo. Afinal, mudanças ou transformações são uma manifestação da passagem do tempo.

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