domingo, 19 de dezembro de 1999

Os silenciosos ruídos do Universo

Você liga seu rádio e pronto: música, notícias, comerciais, informações enviadas por estações de rádio a enormes distâncias. Uma confusão bastante comum que se faz é achar que ondas de rádio e de som são a mesma coisa. Na verdade, ondas de som e de rádio são duas coisas muito diferentes.

Quando escutamos algum ruído é porque algum distúrbio se propagou pelo ar até chegar aos nossos ouvidos, onde essas vibrações são transformadas em sons pelo nosso cérebro. Sem um meio material, como o ar, não existe som. O mesmo com ondas de água; algum distúrbio, como a queda de uma pedra, gera ondas que se propagam pelo meio que lhes dá suporte, no caso, a água.

Já as ondas de rádio são parte das ondas eletromagnéticas, geradas quando cargas elétricas oscilam com alguma frequência. A luz também é uma onda eletromagnética que, após ser captada por nossos olhos, é transformada em imagem no nosso cérebro. A única diferença entre luz e ondas de rádio é a sua frequência; ondas de luz têm frequências centenas de milhares de vezes maiores do que as ondas de rádio.

Como nosso equipamento para captação de ondas eletromagnéticas é bastante limitado (a luz visível pelos olhos e a radiação em infravermelho, ou calor, pela pele), ondas de rádio passam por nós despercebidamente. O mesmo ocorre com outros tipos de ondas eletromagéticas com frequências ainda maiores do que a luz visível, como a radiação ultravioleta, os raios X e os raios gama, sendo que que algumas podem ser bem nocivas à saúde.

Quando você liga seu rádio, ele capta ondas eletromagnéticas na frequência de ondas de rádio (FM, em torno de 88 milhões a 108 milhões de ciclos por segundo, ou megahertz), transformando-as em sons audíveis por nós, vibrações que se propagam no ar e são transformadas em som no nosso cérebro.

A música e as vozes que ouvimos, com frequências entre 50 e 4.500 hertz -muito menores que os milhões de ciclos das ondas de rádio-, estão codificadas nas ondas de rádio emitidas pela estação. Portanto, as estações mandam uma espécie de onda combinada de alta e baixa frequência (chamada de onda modulada), produzida pelo movimento das cargas elétricas nas suas antenas de transmissão.

As estações AM e FM na Terra não são as únicas fontes de ondas de rádio. Nós sabemos que vários corpos celestes, como estrelas e nebulosas, emitem ondas eletromagnéticas, pois podemos vê-las. Toda a astronomia ótica é baseada no fato de que estrelas e outros objetos astrofísicos geram quantidades enormes de radiação eletromagnética, devido ao movimento acelerado de cargas elétricas que, a altas temperaturas, têm frequências na porção visível do espectro.
Ou seja, podemos ver esses objetos. Mas, se isso é verdade, esses e outros objetos podem gerar ondas eletromagnéticas que, apesar de invisíveis, são tão reais como a luz das estrelas. Hoje em dia, a astronomia é subdividida em todas as janelas das ondas eletromagnéticas, da radioastronomia à de raios gama.

Um novo projeto em radioastronomia promete revolucionar nosso conhecimento nessa área. Nós sabemos que fontes de rádio são em geral "frias", geradas em processos no interior de galáxias ou na formação de sistemas solares. As dimensões do projeto Alma (do inglês Grande Arranjo em Milímetros de Atacama) são realmente fantásticas: 64 antenas parabólicas, cada uma com diâmetro de 14 m, arranjadas em uma área de cerca de 10 km de extensão. Quando trabalharem juntas, as antenas serão equivalentes a uma única antena do tamanho de um campo de futebol. Essa estrutura será construída no deserto de Atacama, no Chile, uma das regiões mais inóspitas e secas do planeta, a 5.500 m de altitude.

A vantagem das ondas de rádio é que elas atravessam zonas com poeira e gás. (A recepção do seu rádio não piora com a poluição). Com isso, podemos "ver" fenômenos ofuscados no visível, como regiões em que uma estrela e seus planetas estão nascendo. As antenas da Alma poderão também "ver" objetos a vários bilhões de anos-luz de distância, mais antigos que a Terra: Alma será uma janela para a própria infância do Universo.

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