domingo, 28 de janeiro de 2007

O futuro na ponta do lápis

Composto tirado do grafite promete revolução

Terça-feira passada, dei uma palestra na Universidade de Boston, convidado pelo físico brasileiro Antônio Castro Neto, um mineiro com voz de tenor e uma risada capaz de sacudir paredes. Antônio explora aspectos fundamentais da física por meio do estudo de materiais e suas propriedades.

Quando cheguei, fui direto até sua sala. "Rapaz, estou mexendo com um tema que está pegando fogo", disse ele. "Do que se trata?" perguntei. "Grafeno." "Grafeno? O que é isso?" "É o futuro, meu caro. E o mais legal é que vem do grafite, de um lápis comum!" Grafite é o material cinzento e quebradiço, composto de carbono, que todos conhecem. Microscopicamente, é formado por vários planos superpostos como numa pilha de folhas de papel.

Cada plano, por sua vez, é composto por átomos de carbono alinhados em um padrão hexagonal como nas colméias de abelhas: cada átomo ocupa um vértice do hexágono e o padrão se repete regularmente feito numa parede de azulejos. Antônio me explicou que a coisa toda começou em 2004, quando um grupo da Universidade de Manchester na Inglaterra, liderado pelo físico Andre Geim, conseguiu isolar um único plano de grafite, ou seja, uma "folha" de carbono puro com a espessura de um único átomo. Esse plano de átomos em distribuição hexagonal é o tal do grafeno.

O incrível é como o grupo inglês conseguiu a façanha de isolar um material composto de carbono com espessura atômica: usando o grafite de um lápis e fita adesiva! Após usar um lápis para fazer um traço numa folha de papel, os cientistas usaram a fita para arrancar um pouco do grafite. Com a fita agora contendo grafite, eles repetiram a operação várias vezes usando outro pedaço de fita sobre a anterior, tornando a camada de grafite cada vez mais fina. Após dissolver a fita em acetona, o material resultante foi examinado em um microscópio de alta ampliação.

Explorando as propriedades do material, Geim e seus colaboradores concluíram que tinham mesmo obtido uma única camada de átomos de carbono. Assim nasceu o grafeno. O material tem propriedades muito estranhas. Por exemplo, correntes elétricas são essencialmente compostas por elétrons transportados de um ponto a outro em materiais metálicos. Esses elétrons têm uma massa bem conhecida. No grafeno, os elétrons comportam-se como se não tivessem massa alguma.

A única partícula que não tem massa é o fóton, a partícula de luz. Os elétrons do grafeno comportam-se da mesma forma que fótons, só que com carga elétrica e movendo-se a uma velocidade 300 vezes menor do que a da luz. Com isso, podem ser usados no estudo de efeitos relativísticos que em geral só se manifestam em velocidades muito maiores do que as do nosso dia-a-dia. E isso usando equipamento que cabe em cima de uma mesa. Mas é nas aplicações eletrônicas que o grafeno promete uma revolução.

Por exemplo, um dos problemas na miniaturização de microprocessadores é o aquecimento devido à correntes elétricas. Por isso computadores têm um sistema de escoamento de calor e ventiladores. Com o grafeno, é possível criar correntes com aquecimento mínimo, o que, em princípio, permitirá diminuir ainda mais o tamanho dos computadores. Antônio me contou que a Intel já está investigando o uso de grafeno. E recitou as palavras do filósofo Ludwig Wittgenstein, que parafraseio: "às vezes, as coisas que nos são mais importantes permanecem desconhecidas, escondidas por trás da sua familiaridade."

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