domingo, 4 de fevereiro de 2007

A curiosidade das crianças

Pai, por que o céu é azul? O que acontece de dia com as estrelas?

O escritor tcheco Milan Kundera, em seu mais famoso romance, "A Insustentável Leveza do Ser", presta uma homenagem à curiosidade das crianças: "De fato, as únicas questões realmente sérias são aquelas que até uma criança pode formular. Apenas as questões mais inocentes são realmente sérias. Elas são as questões sem resposta.

Uma questão sem resposta é uma barreira intransponível. Em outras palavras, são as questões sem resposta que definem as limitações das possibilidades humanas, que descrevem as fronteiras da existência humana". Que adulto nunca se deparou com uma criança fuzilando perguntas, "Por que isso? Mas por que aquilo?"

Pena que tantos adultos tenham esquecido que, quando eram crianças, também perguntaram, aflitos, sobre os mistérios do mundo, da vida e da morte, e façam tão pouco esforço para responder às perguntas dos filhos, sobrinhos ou netos: "Pai, por que o céu é azul? O que acontece de dia com as estrelas? O que faz elas brilharem? Será que existe vida em outros planetas? Como a vida surgiu aqui? E as estrelas, como nasceram? O que aconteceu com a vovó depois que ela morreu? Quando você vai morrer?" "Ah, sei lá filho! Pô, pára de ficar fazendo perguntas. Vai jogar bola, vai!" Essa semana dei uma palestra na escola do meu filho de 13 anos.

Na realidade, não consegui dar a palestra. Um dia antes, o professor sugeriu que cada um dos alunos me desse uma pergunta por escrito, algo que quisessem saber sobre astronomia ou física. Resultado: recebi umas cem perguntas, todas relevantes, sobre assuntos de ponta em astrofísica. (Bem, quase todas; uma mocinha pediu-me que convencesse seus pais a deixá-la pôr um brilhante no nariz. Mas ela fez perguntas pertinentes também.) Quando cheguei na escola, resolvi falar apenas sobre as perguntas enviadas e deixei minha apresentação com "Datashow" de lado. Foi uma das melhores experiências da minha carreira como professor.

Primeiro, pelo privilégio de poder falar para 50 crianças e jovens, com idades entre dez e 14 anos. Segundo, pelo entusiasmo contagiante que emanava deles. Era possível sentir a eletricidade no ar, o interesse pelos assuntos, a curiosidade enorme de entender os mistérios do Universo, a tentativa de dar sentido à vida, de pô-la em contexto dentro da visão de mundo científica que tanto define os caminhos da sociedade moderna.

Foram várias perguntas sobre buracos negros, esses estranhos restos mortais de estrelas que esgotaram seu combustível nuclear, cuja gravidade é tão poderosa que pode sugar tudo, inclusive a luz: "O que acontece se cairmos dentro dum buraco negro? Como nasce um buraco negro? Será que a Terra cairá num deles? Será que eles desaparecem? Se nem luz sai deles, como são detectados?" Outras sobre a expansão do Universo: "Por que o Universo está em expansão? Quão rápida é ela? Será que pára um dia? O que existia antes do Big Bang?

Como a gente sabe que o Universo tem 14 bilhões de anos?" E, claro, sobre vida extra-terrestre: "O senhor já viu um extra-terrestre? O senhor acha que existe vida em Marte? E em outros planetas? Quantos planetas extrasolares já foram descobertos?" Será que essas dúvidas são tão diferentes das que a maioria dos adultos? Como disse o físico I. I. Rabi, os cientistas são os "Peter Pans" da sociedade; querem permanecer crianças, curiosos, perguntando-se sempre sobre os mistérios do mundo. De minha parte, decidi que a cada vez que sentir a chama falhar e precisar de um pouco de pó de pirlipimpim, visitarei uma escola e conversarei com as crianças.

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