domingo, 23 de janeiro de 2000

Brasileiros buscam pistas sobre a estrutura da matéria

Quando físicos contam para seus amigos que eles estudam a estrutura fundamental da matéria, num bate-papo durante uma festa ou num barzinho, eles podem querer dizer coisas bem diferentes, dependendo de sua área de especialização; um físico pesquisando as propriedades de materiais, como cristais de germânio ou silício, e outro estudando o interior do núcleo atômico, usam metodologias experimentais completamente diferentes, desenhadas para responder questões também diferentes.

Na corrida pela compreensão do muito pequeno, estamos realizando experiências que investigam a estrutura da matéria a distâncias muito menores do que um próton, o integrante do núcleo atômico com carga positiva e um diâmetro aproximado de um milionésimo de bilionésimo de metro (ou 10-15 metros)!Para tal, usamos máquinas conhecidas como aceleradores de partículas, que aceleram dois feixes de partículas em direções contrárias em um túnel subterrâneo de quilômetros de circunferência.

Em certos pontos, esses dois feixes colidem e os cientistas estudam os detritos dessas colisões, que aparecem na forma de novas partículas. Nos pontos das colisões, físicos posicionam os detectores de partículas, que são como máquinas fotográficas desenhadas exclusivamente para captar tipos específicos de partículas que surgem durante as colisões.

Alguns fatores são essenciais para o sucesso da experiência: 1) quanto maior a energia do acelerador, mais profunda nossa cirurgia no interior das partículas subatômicas; 2) quanto mais "focado" for o feixe de partículas, maior a probabilidade de várias colisões ocorrerem nos pontos de encontro dentro dos detectores: isso é o que os físicos chamam de maior "luminosidade"; 3) quanto mais preciso o detector, maior nossa probabilidade de detectar eventos interessantes, possivelmente até novas espécies de partículas.

Atualmente, o acelerador recordista mundial de energia é o "Tevatron", que se encontra a oeste de Chicago, no laboratório conhecido como Fermilab. O Tevatron tem dois detectores, o "CDF" e o "D0". É no D0, um gigante com altura de cinco andares e pesando centenas de toneladas, que encontramos um grupo de físicos e engenheiros brasileiros, parte de uma colaboração envolvendo 50 instituições de pesquisa em 16 países.

A participação brasileira também representa um consórcio de instituições e universidades que inclui, no Rio, o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e as Universidades Federal e Estadual; em São Paulo, a Universidade Estadual de Campinas e o Instituto de Física Teórica da Unesp; e a Universidade Federal da Bahia.Alguns membros do grupo brasileiro, como Alberto Santoro e outros, já têm uma relação antiga com o Fermilab, havendo participado de vários experimentos na última década.

A novidade é que o D0 está sendo reformado e uma parte importante dessa reforma se deve à contribuição dos cientistas brasileiros. Essa reforma é necessária devido a um futuro aumento na luminosidade do Tevatron, que exigirá um nível de precisão bem mais elevado do detector. O grupo está envolvido no chamado "Detector de Prótons Espalhados", criando dispositivos chamados de "potes romanos", em homenagem ao físico italiano (e romano) Giorgio Mathiae, que desenvolveu os primeiros potes.

Esses potes alojam sofisticados detectores de posição que são então acoplados ao corpo do D0. Com eles, os cientistas esperam seguir o processo de colisão das partículas desde seus momentos iniciais, que passavam despercebidos no passado. A esperança é que esses momentos iniciais incluam fenômenos que abrirão novas direções em nossos estudos da física subatômica.É importante exaltar o aspecto tecnológico do projeto; os detectores de posição usam fibras ópticas acopladas a amplificadores de alta precisão, puxando os limites dessas tecnologias. Isso só pode acontecer nas mãos de um time de altíssima qualidade, um exemplo da ciência de alta qualidade realizada por aqui.

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