domingo, 3 de outubro de 2004

Testes parapsicológicos




Quando era garoto, uma de minhas maiores frustrações era ter um cérebro normal, desprovido de poderes mágicos. Eu passava vários minutos me concentrando, tentando mover objetos com a "força" da minha mente. Tinha ouvido falar de que conhecíamos apenas uns 10% do nosso cérebro e que, se fôssemos capazes de explorar os outros 90%, coisas milagrosas aconteceriam. Estava convencido de que somos todos dotados de superpoderes mentais que só não se manifestam devido ao caos de nossas vidas atribuladas; era só eu me concentrar um pouco mais.

Mas o garfo permanecia indiferente, o guardanapo também, até o palito. Decididamente, não era dotado de poderes telecinéticos. Meu cérebro só movia pensamentos e músculos. Foi então que assisti na TV à uma apresentação do famoso médium israelense Uri Geller. Ele olhava para uma colher e, após alguns instantes, ela estava toda torcida, para surpresa e deleite da audiência. Relógios quebrados voltavam a funcionar. Tudo isso, segundo Geller, devido aos seus poderes mentais. Eu era mesmo um azarado, fadado a ter um cérebro normal. Resolvi deixar a parapsicologia de lado e estudar física.

Por uma dessas coincidências que afrontam o senso comum, fui fazer meu doutorado no King's College em Londres, sob orientação de John G. Taylor, um físico especializado em teorias de partículas elementares. O que não sabia é que Taylor tinha um passado oculto, que o ligava diretamente a -adivinhem- Uri Geller!

Durante os anos setenta, quando Geller viajou pelo mundo com seu show, recolhendo muito dinheiro com seus supostos poderes, Taylor foi convidado pela rede BBC para participar de uma exibição ao vivo. Quando viu o que Geller fazia ficou perplexo. Resolveu montar um laboratório para testar poderes telecinéticos. Escreveu livros sobre o assunto que se tornaram best-sellers. O próprio Taylor virou uma celebridade, o cientista que iria demonstrar a veracidade dos poderes da mente.

Passado um tempo o laboratório estava montado, um assistente havia sido contratado (um argentino enorme, barbudo, com olhos azuis profundos, muito parecido com o Rasputin) e os testes começaram. O próprio Geller foi convidado. Sensores capazes de detectar pressão mecânica foram postos sobre garfos e colheres, eletrodos ligados ao cérebro dos paranormais, câmeras de filmar montadas em pontos estratégicos do laboratório.

E nada. Nenhum efeito foi detectado. Um após outro, os sensitivos desfilaram pelo laboratório, todos fracassando miseravelmente. Taylor escreveu um livro retratando-se, mas a empreitada lhe custou caro. Quando eu dizia que era aluno dele, alguns físicos mais velhos davam um sorrisinho de desdém profundamente irritante. Quando tentei abordar o assunto, Taylor me disse categoricamente que isso era coisa do passado, "tudo besteira".

Uri Geller foi sumindo de circulação. Hoje poucos sabem dele. Mas a crença em poderes parapsicológicos continua firme e forte. O físico francês Georges Charpak, vencedor do Prêmio Nobel, escreveu um livro com outro físico, Henri Broch, expondo a falácia da parapsicologia. Broch, que também é mágico, é capaz de repetir todos os truques ditos paranormais exatamente como fazem os ditos sensitivos.

O mágico americano "Fabuloso Randi" há anos vem fazendo o mesmo. Tudo não passa de mágica enganosa, feita por pessoas desonestas que exploram a credulidade e inocência das pessoas como eu adolescente, que querem acreditar em mundos ocultos e poderes sobrenaturais. Pessoas enfadadas com os limites da realidade.

Foi então com surpresa que li uma resenha do livro de Charpak e Broch no "New York Review of Books" escrita por Freeman Dyson, um mentor e amigo. Segundo Dyson, a parapsicologia não deve ser descartada só por que testes em laboratório falham. Talvez, especula, os métodos científicos atuais sejam inadequados para examinar o mundo paralelo de certos fenômenos mentais. Acho pouco provável. Por que nenhum cientista sério tem esses poderes? Por que um paranormal não faz uma demonstração que Randi ou Broch não possam reproduzir? Mas adoraria concordar com Dyson. Estamos sempre querendo ser mais do que somos.

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