domingo, 17 de setembro de 2006

O Sol virtual

De longe, duma praia, por exemplo, o Sol parece um objeto pacato, um disco que emite luz e calor sempre do mesmo jeito, dia após dia. Na verdade, o Sol é uma fornalha infernal, com temperaturas na superfície chegando a 6.000C. Não só isso; sua superfície é extremamente instável, borbulhando sem parar, composta de um gás de partículas como elétrons e prótons conhecido como plasma. Por trás dessa agitação toda está o calor gerado no interior solar, onde a temperatura chega a mais de 10 milhões de graus Celsius.

Volta e meia o Sol passa por períodos de atividade intensa, nos quais bolhas gigantescas de matéria, algumas pesando bilhões de toneladas, são emitidas para o espaço como bólidos incandescentes. Cerca de 10% dessas emissões vêm na direção da Terra, à velocidade de 1,5 milhão de quilômetros por hora. Essas bolhas de matéria magnetizada são conhecidas como ejeções coronais de massa. Se poderosas o suficiente, podem causar sérios danos aqui na Terra.
Essas tempestades solares são responsáveis, por exemplo, por desestabilizar a órbita de alguns satélites, sendo até capazes de danificar seus sensores. Astronautas na Estação Espacial precisam procurar abrigo devido ao aumento de radiação. Mesmo passageiros em aviões podem ser expostos a doses perigosamente altas de raios X. A quantidade de energia liberada é tamanha que seus efeitos podem às vezes ser sentidos na superfície terrestre: em 1989, uma dessas tempestades provocou pane em usinas elétricas da região de Québec, no Canadá, resultando em um apagão.

Esses danos e o potencial para outros ainda maiores fomentam o interesse em prever o comportamento do Sol, fazendo estimativas de quando essas tempestades poderão ocorrer.

Pela primeira vez um comportamento do astro foi simulado com sucesso

O problema é extremamente complexo: o Sol demora 34 dias para girar sobre si mesmo nos pólos e 25 no equador. Essa rotação diferenciada distorce os campos magnéticos que existem no interior da estrela, tornando sua descrição matemática complicada. Uma boa visualização do campo magnético solar é imaginar que sua superfície é coberta por fios de cabelo que avançam por seu interior. Alguns desses fios formam arcos, saindo em um ponto da superfície e entrando em outro. Esses fios são as linhas do campo magnético solar. Com a rotação, tais linhas são retorcidas de tal forma que, de vez em quando, arrebentam e arremessam parte da matéria solar para o espaço, como uma pedra lançada por um estilingue. As pedras, no caso, são as ejeções coronais de massa.


Recentemente, um grupo de astrofísicos conseguiu um feito fantástico. Eles desenvolveram simulações do Sol capazes de reproduzir seu comportamento quantitativamente. O teste deu-se no eclipse total do Sol do dia 29 de março deste ano, o de maior duração de que se tem notícia, com quatro minutos e sete segundos de totalidade, isto é, com a Lua bloqueando todo o disco solar.

Duas semanas antes do eclipse, o grupo liderado por Zoran Mikic e Jon Linker, de uma empresa de San Diego no EUA, apresentou em detalhes como o Sol se comportaria durante o eclipse, em particular a corona, a região externa à superfície solar visível apenas durante eclipses. Foram necessários 700 computadores rodando por 4 dias. Mikic foi até a Turquia confirmar se suas simulações funcionaram. O sucesso convenceu a comunidade cientifica de que, pela primeira vez, o Sol virtual brilhou como o real. Parece que a equipe celebrou com muita cerveja, aparentemente da marca mexicana "Corona". Mas o ponto é que, com isso, vai ficar mais fácil prever quando tempestades solares podem ameaçar a Terra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário