domingo, 24 de setembro de 2006

Entre a física e a metafísica


É pensando nas fronteiras do saber que novas idéias surgem

Metafísica, por definição, é o estudo dos fundamentos da realidade e do conhecimento. Por fundamentos da realidade deve-se entender o significado do ser, do saber, da substância, da causa, da identidade, do espaço e do tempo. Física, por sua vez, está relacionada com o estudo do mundo material e as leis que descrevem seu funcionamento.

Qual a relação entre as duas, se é que existe alguma? Coloquialmente, metafísica virou exatamente o que não é realidade. Quando alguém fala, "Ah, mas isso é metafísica", a conotação é de que o assunto sai da realidade, é especulativo demais, coisa de sonhador. Estranho como o sentido da palavra foi modificado.

Mas será que essa divisão entre a física e a metafísica realmente procede? Talvez no passado fizesse mais sentido, se bem que as duas sempre flertaram. O ponto é que a física, especialmente a física moderna, desenvolvida a partir do inicio do século XX, também lida com noções de saber, de espaço e de tempo. A modificação, ou melhor, o casamento entre a física e a metafísica, se solidificou quando Einstein desenvolveu sua teoria da relatividade, combinando os conceitos de espaço, tempo e matéria. Se a matéria encurva o espaço e pode afetar a passagem do tempo- como explica a teoria da relatividade geral (1916)-, é impossível falar de um sem mencionar o outro. Ou seja, o comportamento e as propriedades da matéria são intimamente ligadas com a estrutura do espaço e do tempo. Ademais, se um observador em movimento em relação a outro obtém medidas diferentes de espaço, tempo e massa -como explica a teoria da relatividade especial (1905)-, o saber, se interpretado como dependente do que aferimos da realidade, também é parte da física. saber, no caso, equivale a informação
Talvez seja por isso que alguns físicos brincam que enquanto os filósofos discutem as propriedades do espaço e do tempo, eles as descobrem e definem. Na verdade, as duas disciplinas estão mais juntas do que se admite, a filosofia (da ciência, deve-se dizer) focando nos conceitos e a física na matemática, ambas tentando entender nossa relação com a realidade física e subjetiva do mundo.

Recentemente, alguns físicos vêm sendo acusados de estarem fazendo mais "metafísica" do que física, no sentido coloquial. Trabalham na teoria das supercordas, que supõe que as entidades fundamentais da matéria não são partículas pontuais mas tubos submicroscópicos capazes de vibrar de modos diferentes. Cada vibração tem sua freqüência que pode ser equacionada como uma partícula de matéria. O objetivo das supercordas é unificar as duas teorias fundamentais da física moderna, a teoria da relatividade e a mecânica quântica, que descreve o comportamento dos átomos e das partículas subatômicas.

O problema é que a matemática da teoria é extremamente complexa e leva a previsões realmente bizarras. Por exemplo, o número de dimensões do espaço não seria três, como pensamos (norte-sul; leste-oeste; acima-abaixo) mas dez, uma temporal e nove espaciais. As seis dimensões extra estariam enroladas em uma esfera ou outra geometria compacta de tamanho tão pequeno a ponto de ser absolutamente invisível aos nossos olhos e aos experimentos. Outra previsão é a existência de uma série de partículas, ditas supersimétricas.
Infelizmente, nenhuma das previsões foi ainda verificada. Alguns dizem que jamais serão. Mesmo que isso seja verdade e as supercordas não passem de uma fantasia, é pensando nas fronteiras do saber que novas idéias surgem, algumas corretas. O duro é não insistir em algo errado a ponto de não ver-se o óbvio.

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