domingo, 3 de setembro de 2006

A escada modular



A engenharia natural depende de padrões que se repetem


Qualquer tipo de engenharia, para funcionar, precisa de módulos: partes de máquinas facilmente substituíveis ou que podem ser encaixadas umas nas outras rápida e eficientemente. Quando era garoto, adorava brincar com blocos de madeira e mais ainda com o Lego, aqueles tijolinhos de plástico que podem se transformar em aviões, barcos, espaçonaves ou monstros. Não é à toa que a engenharia usa a construção modular; a natureza também gosta de módulos, e o que fazemos é imitar, humildemente, o que aprendemos com ela. Os módulos mais simples são os átomos, conjuntos de apenas três partículas: elétrons girando em torno de núcleos feitos de prótons e nêutrons. Como num jogo de Lego que contém apenas três tipos de peças (mas muitas de cada uma delas), os átomos organizam suas partículas para criar todos os elementos químicos que ocorrem no Universo, do mais simples, o hidrogênio, com um elétron e apenas um próton no núcleo, ao urânio, com 92 elétrons e prótons e 146 nêutrons (há átomos maiores, mas eles foram criados artificialmente).

Após os átomos vêm as moléculas, combinações de átomos. A mais famosa talvez seja a molécula de água, com dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. Aqui, o número de combinações dispara; imagine poder combinar átomos de vários tipos e em números diversos, usando a atração elétrica entre eles. Existe, entretanto, uma distinção entre dois tipos de moléculas: as inorgânicas e as orgânicas. Como já diz o nome, as moléculas orgânicas têm algo a ver com a matéria dos organismos. Essencialmente, a química orgânica trata dos compostos formados por átomos de carbono, com exceção de sais simples, como carbonato de sódio. O interessante é que o conceito de módulo reaparece na química inorgânica e orgânica. Na inorgânica, temos os cristais, arranjos regulares de átomos. Na orgânica, da mesma maneira, os polímeros são compostos que repetem uma seqüência contendo átomos de carbono ligados entre si, como a espinha dorsal de uma serpente, C-C- C-C... Por sua vez, os átomos de carbono ligam-se a outros átomos, como hidrogênio ou radicais de hidroxila (OH), que têm um átomo de oxigênio e um de hidrogênio.

No próximo degrau na escada modular, encontramos as macromoléculas orgânicas, essenciais para a vida. A molécula de DNA, responsável pela transmissão de informação genética de geração a geração, tem uma estrutura modular baseada em grupos de aminoácidos, moléculas que contêm carboxila (COOH) e aminas (NH2). Os aminoácidos têm um papel fundamental na vida, sendo integrantes das proteínas.

Continuando, chegamos às células, bolsas contendo inúmeras estruturas que também se repetem, formadas, por sua vez, por macromoléculas orgânicas. Já as células se organizam em grupos modulares para criar os diversos tecidos. Módulos dentro de módulos dentro de módulos... Existe um princípio operando aqui, uma engenharia natural que se beneficia da repetição de padrões, que constrói estruturas cada vez mais complexas a partir de partes mais simples. A escada modular continua ao pularmos para o espaço. Vemos a repetição de padrões nas estrelas e suas cortes de planetas, nas galáxias que contêm bilhões de estrelas, e até nos grupos de galáxias, que podem ter centenas ou milhares delas, atraídas gravitacionalmente. Se nos átomos, nas moléculas e nas células é a atração elétrica que controla a composição modular, no espaço as estruturas são forjadas pela gravidade. Muda o cimento, mas não o princípio arquitetônico: o complexo pode surgir do simples. O todo é muito mais do que a soma das partes.

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