domingo, 1 de agosto de 2004

O debate climático esquenta

Poucos tópicos em pesquisa científica têm a influência sócio-econômica da questão climática: afinal, o mundo está esquentando ou não? Essa história de efeito estufa é real ou inventada por cientistas radicais? Eu mesmo escrevi várias vezes sobre o assunto, que me preocupa. Imagino que a maioria dos leitores desta coluna partilhem de minha ansiedade. A questão esbarra em várias deliberações, misturando ciência com política, economia e mesmo ética. Ninguém em sã consciência gostaria de deixar um mundo em piores condições para as gerações futuras. Infelizmente, nem todas as consciências são sãs.

A questão climática está passando por uma séria crise no momento. Há alguns anos, o Painel Internacional para Mudanças Climáticas (IPCC), organização que reúne cientistas do mundo inteiro, publicou um estudo alertando para o perigo do efeito estufa, que já estaria ocorrendo e poderia ter conseqüências terríveis para a sobrevivência da humanidade ainda neste século: o aumento da temperatura provocará a elevação do nível do mar, o degelo das calotas polares influenciará a salinização do Atlântico Norte, interrompendo a corrente que garante o clima temperado da Europa e da costa leste dos EUA, novas pragas surgirão, prejudicando a agricultura, até mesmo a malária em latitudes mais altas. Este quadro apocalíptico só poderá ser evitado se países passarem a controlar rigidamente a emissão de dióxido de carbono, o CO2. Como os EUA produzem 25% do CO2 mundial e a Rússia 17%, os dois países são os alvos principais da campanha do IPCC. Até Hollywood entrou no debate com o filme "O Dia Depois de Amanhã", em que o efeito estufa traz uma crise climática devastadora.

O Protocolo de Kyoto trata justamente dessa questão. Ele só pode entrar em vigor se 55% da emissão mundial de CO2 estiver incluída nos países signatários. Os EUA se recusaram a assinar, e a Rússia ameaça ir pelo mesmo caminho. O principal conselheiro econômico de Vladimir Putin, Andrei Illarionov, acredita que o protocolo pode arruinar a economia russa: a questão climática não é apenas científica; ela é, essencialmente, uma questão econômica.

Tudo seria muito mais fácil se os cientistas chegassem a uma conclusão à prova de bala que, de fato, o efeito estufa é uma realidade inevitável. Infelizmente, em assuntos de extrema complexidade, não existem respostas simples. E a previsão climática, especialmente de longo prazo, é extremamente complexa. Não só porque existem inúmeras variáveis, mas porque a análise depende de dados históricos que muitas vezes têm interpretação ou validade dúbia.

A combinação vem provocando uma reavaliação da questão climática. As previsões do IPCC estão mesmo corretas? Alguns dizem que não. Entre vários fatores, eles alegam que o aumento de temperatura só se dá perto da superfície; maiores altitudes não sofreram alteração no século 20. Mas ninguém sabe explicar por que a temperatura só aumenta perto da superfície. Como é aqui que vivemos...

Os mesmos grupos criticam as simulações climáticas usadas pelos cientistas do IPCC, acusando-as de estarem erradas. Alguns dizem até que elas são incapazes de reproduzir as medidas obtidas até agora. Se esse for o caso, como essas simulações vão prever o que ocorrerá daqui a décadas?

Em vista da presente confusão, só resta agir com cautela e recordar certas lições sobre poluição. Para mim, a melhor delas é o buraco na camada de ozônio. Detectado nos anos 60, ficou claro que ele era causado pela emissão de fluorocarbonetos. Ou seja, a atividade humana pode influenciar negativamente a atmosfera. Controlada a emissão, o buraco foi fechando. A Terra, sendo um sistema finito, tem capacidade limitada de suportar a incessante perturbação humana. Mesmo que existam controvérsias climáticas, o preço por erros cometidos agora será alto demais. Especialmente porque serão os nossos filhos a pagá-lo.

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